sábado, 14 de julho de 2012

Ser improvável

Esta semana revivi uma alegria do passado. E revivi não por simples lembrança. Mas por um acontecimento. Que não foi igual ao passado, embora tenha trazido emoções já experimentadas. Falo do título do meu clube, o Palmeiras: campeão da Copa do Brasil de 2012.

Jovem campeão celebrando o título. Crédito: Palmeiras/ fábio menotti (aplicação de efeito sobre a foto)

Quem acompanha futebol sabe que meu time andava mal. Fazia um tempo que amargava resultados medianos ou ruins, más sortes e que tais. Mas quem é torcedor de verdade não abandona. Xinga, lamenta, começa a pensar que o problema é você. Você que traz azar. Você que não pode ver jogo na TV. Ou no estádio. Você não deveria nem existir. Há de tudo quando a paixão clubista bate no peito.

Neste ano, os fatos pareciam me dizer que eu continuava com uma nuvem sobre a cabeça. Nuvem pesada, chovendo, com raios e trovoadas. Por vezes, a sensação melhora. Noutras, a nuvem fica tão preta e gorda que tenho medo de atingir outras pessoas. Seria por essa razão que meu time andava tão por baixo, enxovalhado pela imprensa, massacrado na mídia social (e depois vem gente falar de “anti”! O que se malhou meu time não foi pouco. Então, sem exagerar nesse negócio de “anti”. As pessoas querem fazer piada – muitas vezes de mau gosto – à custa dos outros. Qualquer outro)?

Até que veio a redenção. Contra tudo e contra todos, o Palmeiras foi se superando na Copa do Brasil. Veio tropeçando, ferido em seus brios, sem ter trégua, sem ter um voto de confiança que não fosse de sua torcida (e ela mesma andava desconfiada). Virou mania espezinhar meu time. Mas tudo bem. As pessoas não podem viver para agradar às demais. Apesar disso, muitas vezes fiquei aborrecida por perceber que se abusava. Não. Abuso não. Ninguém precisa me amar. Mas me desrespeitar, isso não.

Por isso, quando veio o título, vibrei, pulei, senti a emoção tomar o corpo. Queria dizer: isso sim é viver. É sair debaixo e atingir o topo, mesmo com o vento contra, mesmo com a maré jogando forte contra o casco. 

Torcida que canta e vibra. Contra tudo e contra todos. Reprodução da TV

Daí, veio, aos poucos, a razão assumir o controle da situação. Começaram a se espalhar as comemorações. Campeões invictos, ressaltavam uns. Confesso que isso não me tocou. Não se tratava disso. O ponto alto da conquista, na minha opinião, não se referia à condição de invicto. Isso foi um fator importantíssimo para o título, claro. Mas o maior deles, para mim, estava na superação. Em vencer mais do que o jogo. Em vencer a descrença e vencer as depreciações que se faziam.

Ilustração retirada do Facebook, após a conquista da Copa do Brasil 2012

Ser invicto, no final, pouco me emocionava. O que me importava de verdade era uma palavra que surgiu aqui e ali, logo após a conquista, e depois se espalhou em uma série de artigos, textos, comentários. Improvável. Sim, isso me dizia algo.

Primeiro falaram do “herói improvável”, que era Betinho, ex-jogador do São Caetano que entrou no lugar do artilheiro Barcos. Ele não tinha nem um contrato longo com o clube naquela partida. Mas desviou a bola da cobrança de falta de Marcos Assunção. Bola que resultou no gol de empate, o gol que assegurou o título.

Herói improvável. Depois, título improvável. Ok. Era improvável, mas sem sabermos disso fomos lá e vencemos.

Ser improvável. Muito melhor do que ser invicto, diante do contexto que envolveu o clube. Quer dizer que você remou contra a maré, e não se intimidou. Isso tem valor! 

Valdívia: explosão de alegria. O rosto mostrando a emoção de superar toda adversidade

Todos nós já tivemos alguma experiência (acredito) que prova que podemos superar adversidades. Para falar apenas de corrida, na minha primeira vez, lá em dezembro ou janeiro passado, quando tentei correr de verdade, meus pulmões gritaram e eu estava bem longe do primeiro quilômetro. Bem longe. Eu olhava a marca que tinha estabelecido e a via distante. Foi um golpe duro naquele dia. Porque eu acreditava que conseguiria fazer aquele trecho. Afinal, não fumava (nunca fumei), já vinha fazendo caminhadas fortes.

Sabia que estava mal por outros motivos. Quando desisti da meta naquela ocasião, arfava e duvidava se conseguiria, de fato, superar tudo o que me propunha a superar. Meu objetivo final é correr a São Silvestre. Como faria isso se não dava conta de um quilômetro?

Mas a gente tem de insistir. Tem de se preparar e continuar. Voltei a tentar e venci o primeiro quilômetro. Mais do que isso: dei uma volta completa no parque. Eu já estava quase morrendo, já tinha cumprido o quilômetro... no entanto, estava lá uma meta que ainda não tinha atingido: completar uma volta inteira, o que se daria ao atingir uma reta. Uma reta. Vinha de uma pequena subida, o coração explodindo, porém eu a via clara na minha frente. Insisti mais um pouco e cheguei à reta. Naquele momento, eu queria gritar. Ninguém me entenderia. Era uma vitória solitária. Era mais do que cumprir a volta no parque, coisa para o qual não me julgava habilitada naquele momento. Era o primeiro passo na crença de que posso, sim, chegar lá. Dezembro ainda está longe. A São Silvestre ainda está longe. Mas eu posso chegar lá. Eu quero chegar lá. Em janeiro, quando falei dessa meta, talvez soasse improvável.

Isso que contei é bem pequeno perto da “improbabilidade” que era meu time ganhar o campeonato. Foi bom assim. Conquistar o título na descrença e provar que ainda estamos vivos.

Mais legal foi ver isso reconhecido em uma coluna do Xico Sá. Escreveu ele: “Alvo de chacota da imprensa e de pedradas até de parte dos seus próprios fãs, os caubóis da Pompeia se vingaram com o título da nossa taça mais nacional, a única que vai do sertão ao cais, espécie de Coluna Prestes da bola.

Até o discurso da comemoração, você reparou, caro palmeirense, saiu mais para o desagravo, a legítima defesa da honra do grupo, do que para a desabrida alegria da vitória. Muito compreensível. Entendemos a voz empoeirada do velho oeste sem carecer de legenda.

Os caubóis renegados da Pompeia têm pleno direito ao desabafo. Quem acreditava neles? Quase ninguém. E ainda chegaram à decisão com um time em remendos, sem o mago e sem o pirata. Com homens machucados, porém destemidos
.”

E continua o texto: “O triunfo do Palmeiras é de outra natureza. É de bravura. Nem por isso deve deixar de ser celebrado. A coragem talvez seja o maior luxo da condição de ser homem.

Só perde, talvez, para a vergonha na cara. Os renegados da Pompeia souberam dosar as duas qualidades. Mesmo sob chuva de balas não fugiram ao duelo sob o sol das contrariedades. Bravos
.”

Acho que não preciso falar mais. Também sou improvável. E homenageio um dos improváveis campeões, o Marcos Assunção, que sedimentou o caminho para o título. E que chorou como um homem diante das câmeras de TV. 

Marcos Assunção, jogador que faz diferença, mesmo sendo "velho"
Marcos Assunção, que chorou ao falar com o filho, a quem prometera o título. Orgulho no peito
Para finalizar, vai o vídeo que tem repercutido bem na web. Ao menos entre os palmeirenses. Espero que outros saibam apreciar o tom desse trabalho, que é de superação. Ele está bem feito e teve uma ótima escolha de trilha sonora. Particularmente gosto do trecho de “Festival”, da banda Sigur Rós. Esse trecho toca no final de “127 horas”. Esse filme, por sinal, também fala de superação. É isso. Que a gente se supere, mesmo quando isso pareça improvável.


2 comentários:

  1. Eu acho que essa história de "futebol moderno" vem acabando com a essência do esporte... é muito torcedor-cliente, muitá "ética" em campo, muitos pontos corridos...

    O fato de ser invicto para mim também não significou tanto. O que eu mais gostei de ver no campeonato foi a raça do Palmeiras. Não temos uma equipe brilhante, nem uma diretoria organizada e não somos exemplo de relacionamento com a imprensa... mas mesmo assim aquele espírito guerreiro dos anos 90 de alguma forma incorporou no time na noite de 11 de julho.

    Espero que seja o começo de uma nova era gloriosa. Avanti!

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  2. Verdade: a raça foi uma marca desse campeonato. No Brasileiro, diante do São Paulo, a raça voltou a se manifestar. Mas agora é preciso ganhar mais pontos. O Palmeiras jogou melhor. Está mais do que na hora de colher esses resultados. Valeu, Mariana.

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