sexta-feira, 25 de maio de 2012

Like Forrest Gump. Ou ‘meu rosto está verde’?

Não sei por que a gente faz isso, mas basta estar de férias em um lugar diferente que o espírito caminhante avança corpo adentro e você acaba andando dez vezes mais (20? 30?) do que faria num dia normal. É sempre assim. Ao menos comigo.

Estou recolhida por uma semana para botar o corpo e a mente para descansar. Bem, o corpo não está descansando exatamente. A mente? Acho que sim. Trouxe dois livros e mais o iPad. Estou lendo dois livros ao mesmo tempo. Um de papel. Outro, virtual. Isso ajuda a relaxar. Deve ser por isso que tenho vontade de escrever. Vem um monte de letrinhas doidas para preencher o espaço vazio.

Se alguém perguntar se isso é descansar, respondo que sim. Para mim é. Não sou do tipo que abandona a tecnologia. Não quero. Gosto de estar conectada. Isso é parte do meu dia-a-dia. Faz parte de mim. De verdade. Estar conectada não é algo que o trabalho me obriga. Nada. Gosto disso como gosto de andar. Está em mim.

Explicado esse ponto, vamos ao relato de uma quinta-feira nada atípica. Aliás, estes dias não têm nada de típicos. A começar pelo fato de que estou sozinha na pousada. Não é engraçado ter um hotel só para você?! Pensando bem, não. Lembrei agora de “O Iluminado”. Na noite de quarta, por exemplo, fiquei brincando de acender luzes na parte da pousada que habito: o segundo andar de um bloco de apartamentos novo, bonitinho e bem aberto. Pois fui acender a luz de uma ala que nada tinha a ver comigo. Fui acender apenas, como uma criança curiosa. E do teto saiu voando um pássaro. Ou dois. Não tive certeza. Mas gritei e saí correndo como uma criança medrosa. Eu me assusto com seres voadores (na terça-feira desta semana, por exemplo, gritei alto porque um morcego deu um rasante sobre mim e sobre a Laura, na noite do futebol feminino, na região da Barra Funda, São Paulo, capital).


Esta é a pousada onde resolvi me isolar


Depois do susto do pássaro (opa, outra reminiscência do cinema, desta vez Hitchcock), fiquei esperta. Não estou mais explorando espaços que não me dizem respeito. Sou medrosa. Pela madrugada, ouvi sons cuja origem não consegui identificar. Não os temi. Mas ao escutar um bezerro mugindo eu me arrepiei. Coisa mais besta se assustar com algo que a gente sabe o que é.

Estar sozinha numa pousada te faz acelerar fantasias. Aumenta o poder da imaginação. Ouvi o latido de Zulu, o dog alemão preto que toma conta do pedaço. Não parecia ser nada demais. Apenas uma advertência. Não adiantou falar desse jeito para mim. Fiquei com o ouvido apurado. E se fosse um serial killer invadindo a pousada?

Zulu, o guardião. Intimida, não?! Mas ele é um doce. Gigante, mas doce

Felizmente, uma hora eu dormi. Acordei às 6h30 e fui conferir a janela. Névoa. Neblina. E um frio de congelar ossinhos. A visão me trouxe a memória um comentário de uma irmã minha quando estivemos em São Francisco de Paula (RS), num inverno. A pousada tinha outros hóspedes, mas eram pouquíssimos. Em dado momento do começo da noite, no breu, o dono enviou alguém para entregar mais toalhas para a gente. Minha irmã pulou da cama com as batidas na porta. Olhou pra fora e disse: “Parece Silent Hill”. Lembrei disso na hora em que me estiquei na janela para conferir o tempo na manhã da quinta-feira.

Meio Silent Hill, mas os mugidos das vacas ali por perto me trouxeram de volta à realidade. Chequei o relógio. Não era cedo para correr, dentro dos meus parâmetros. Mas a neblina não me entusiasmou. Voltei para os dois edredons que me protegeram na noite.

A quinta-feira amanheceu assim (algumas das fotos estão no molome.com/lecastel)

Tomei meu café e estava esperando o momento que sairia para correr. Estava calculando quando voltaria porque precisava me organizar para pegar um ônibus rumo a outra cidade que fica nas cercanias (meta do dia). A pousada onde me encontro dista pouco mais de 3 km do centro. Um exercício interessante. Ou seja, para estar às 11h na rodoviária eu teria pouco tempo para correr, voltar, tomar banho e partir.

Claro que não deu tempo.

O café da manhã demorou um pouquinho (acho que não acreditaram que eu estaria às 8h em ponto no salão). Mas tudo bem. Fiquei conversando com a moça da pousada. Falamos sobre aprender idiomas. Ela estuda inglês, embora não curta (“as letras não têm nada a ver com o que se fala”), e gostaria de retomar os estudos de espanhol. Enquanto isso, Zulu nos assistia e fazia cara de pidão. Queria uma rosquinha.

Run, Forrest

Estava tudo muito bom (inclusive o café), mas eu estava de olho no relógio. Esperei 40 minutos entre o fim do café e o início da corrida. E parti. Na estrada, os primeiros metros foram tranquilos. Tinha de sair de lá e pegar outra estrada asfaltada, mas quase sem movimento.

Logo percebi que o café da manhã pesava. Não tinha comido nada demais, mas correr com o estômago ainda cheio não dá certo. Foi o que senti quando peguei a primeira subidinha. Estou no pé da Serra da Mantiqueira. Seria normal pegar subidas. E normal sentir o esforço. Ruim foi sentir o esforço com o “peso” me atrapalhando (em Buenos Aires, quando corri meia hora depois do almoço, quase vomitei; péssima experiência).

Fui avançado pela estrada com vontade. Às vezes parava parar tirar uma foto. Fora isso, eu me via como Forrest Gump, correndo no asfalto. Espero que se recordem dele no filme correndo sem razão aparente.

Run, Forrest (crédito Photobucket)

Tinha metido um boné para me proteger do sol. Estava com celular e chave nos bolsos da calça. E mais o Nike Plus (além do Runkeeper funcionando no Nokia: queria que o GPS fizesse um mapa). Em alguns trechos tive de me esforçar legal. Não apenas porque era subida, mas porque era uma curva fechada que não oferecia muita visão para o motorista. Ou seja, havia chance de vir um louco acelerando e, sem me enxergar, me acertar. Nessas curvas, eu desligava o som e prestava muita atenção para perceber se vinha carro. E acelerava na corrida.

Um registro no meio do caminho. No molome escrevi: "cuidado com as vacas" (para fazer comentários na foto, clique aqui)

Eu corria e pensava se algumas das poucas pessoas que cruzaram por mim não estranhariam esta mulher de boné, camiseta agarrada ao corpo (dry fit) e calça esportiva subindo a serra a pé em vez de estar num carro, numa bicicleta ou num cavalo. Chegou um momento que pensei que deveria ter posto o short ou a bermuda de ciclista tamanho calor sentia. Meu corpo estava quente, o que me fez dispensar no primeiro quilômetro a blusinha que tinha posto por causa do frio. Transpirava. Detesto suar. Não me agrada nada sentir gotinhas na nuca, nas têmporas e nos fios do cabelo. Menos ainda no rosto, especialmente se esquento tanto que embaça os vidros. É que eu uso óculos. Corro de óculos. Sou míope de 4 graus. E tenho pavor de lente de contato e de cirurgia.

Ocorria-me, de vez em quando, que alguém poderia perguntar na estrada por que corro. Tá treinando? É diversão? Começou agora? E lembrei que o Forrest Gump correu do nada e foi indo... e as pessoas o seguindo. Você corre pela paz no mundo? Ele nada respondia.

Bem, corri quase 7 km. Teria corrido mais se não fosse o relógio. Ao voltar para a pousada calculei que não daria mais tempo de pegar o ônibus no horário pretendido. Tinha mais de 3 km de caminhada pela frente. Tomei meu banho devagar. Até cantei no chuveiro em alto e bom som. Eu estou sozinha! “Mangueira, teu cenário é uma beleza que a natureza criou” (conhece essa música na voz de Elizeth Cardoso? Não? Experimente um trechinho: avance para 1min23 neste vídeo).

Vamos contando: até o centro desta cidade no pé da Serra da Mantiqueira foram pouco mais de 3 km. O Runkeeper assinalou , na verdade, uns 4 km, mas o povo daqui falou que eram três. Enfim... Da pequenina rodoviária peguei o ônibus “circular” e paguei menos de R$ 2,75 para ir até a cidade vizinha, que dista cerca de 20 km do “meu pedaço” e está mais no alto. Viajei de pé (ônibus lotado). A viagem levou mais de meia hora porque a estrada é muito sinuosa. De novo, subidão. Pensei se poderia fazer esse caminho a pé. Sim, mas não correndo. Deve ter gente que completa esse desafio. Estou longe disso.

Depois de bater perna pela rua principal da cidade do alto e subir três vezes essa avenida (por erro de cálculo e de informação), decidi parar num restaurante chamado Seu Xico e comer uma refeição muito boa. Já era tarde (15h15 quando dei a primeira garfada na truta com cogumelos que pedi). Ainda fiz uma horinha para não me sentir mal na estrada. Isso porque eu iria fazer um caminho para ver uma cachoeira. A mulher tinha dito: são 3 km. Em uma hora você chega lá. Se andar rápido, chega antes. Ora, andar rápido é meu nome.

Lá fui eu, pela estrada afora. Assim que pisei no chão de terra, veio uma imagem nada atraente. O relógio marcava pouco mais das 16h. E se a escuridão me pegasse no caminho? E se a cachoeira estivesse numa mata tão fechada que, ao chegar lá, o manto da noite me cobrisse? E se eu fosse atacada por bichos? Primeiro bicho em que pensei foi o homem (medo!). Em seguida foram insetos chupadores de sangue (terror!). Ou insetos voadores (pânico!). De novo acelerei os passos.

Obviamente fiz em menos tempo a distância entre a praça central e a cachoeira. Menos de uma hora se andasse rápido? Bah. Fiz em meia hora. Desconfio dos 3 km. A distância pode ser maior. Quando você está no interior, a tendência é minimizar as coisas. Recordo de uma vez, na região de Visconde de Mauá, no lado mineiro, ter perguntado a um “minino” (tem de escrever assim, como se me inspirasse Guimarães Rosa), se o poço das Antas ficava longe. Ele respondeu: “é pertico”. Não saiu do alto da cerca onde se encontrava sentado. Apontou a direção. Disse para subirmos na trilha onde estavam as vacas (“aquelas ali”) e falou “meia horinha”. Pois sim: levamos uma hora para chegar ao tal poço das Antas, de água tão gelada que foi impossível entrar nela (sacaram por que se chama “das Antas”? As antas éramos nós). 

Voltando à serra dos tempos atuais: acho que dá pouco mais de 3 km entre o centro e a cachoeira Pedro David, mas não poderia dizer. O Runkeeper não tinha como funcionar porque a Claro simplesmente não existe na cidade. No phone, no apps. Para usar celular lá, só Vivo ou TIM. Cadê as marcas para ativar essas “propriedades” no município de SFX?! E o Festival da Mantiqueira estava para começar!!!

Meu destino: Pedro David


Sozinha

Pedro David... por que alguém deu esse nome à cachoeira? Não havia viva alma para perguntar isso quando cheguei à cachoeira. Aliás, tive medo (de novo?! Covarde, covarde!). Entrei na área preservada – e anunciada como tal por todos os lados. Vi um cartaz proibindo práticas religiosas no local (perdão, ninfas da água e elfos da floresta... não poderia fazer oferendas. Sorry, fadas). Vi um monte de coisas. Mas gente? Ninguém. Desci o trecho sinalizado com a placa “Cuidado. Risco de queda”. Parecia meu pai dizendo muitos anos atrás: “mas você não pode dirigir. Não controla o carro direito. Não sabe usar os freios. Você vai acabar se matando”.

Sim, desci com os sentidos em alerta. Tinha desligado o som. Não queria distrações. E se de repente um urso grunhisse no meio do mato e... Tá bom, tá bom. Não temos ursos por aqui. Desci com cuidado a trilha sinuosa e perigosa (os dizeres “risco de queda” não saiam da cabeça).

E com vocês: Pedro David. Prazer

Como eu imaginara, ali estava mais escuro. Mas daria para voltar para a praça central com luz do sol ainda. Poderia relaxar um pouco, não?! Então, vi a ponte que leva para o “meio” da cachoeira. Estava bem feita e tal. Só que veio de novo o temor. Se ela caísse, teria de dizer adeus ao mundo. A queda, creio, não seria fatal. Mas a força das águas me levaria para adiante e eu sumiria na mata sem poder me despedir dos que amo (nessas horas vem o pensamento “por que não fiz um testamento?”; não é que eu seja catastrofista). Calma, a ponte não tinha nada de cenário de Indiana Jones. A cabeça, porém, já estava inundada de fantasias e imaginação. 

Encarei a ponte, fiz fotos, apreciei o visual. E ouvi um ligeiro “crack”. Não sei de onde veio. O coração parou um pouquinho. Olhei para a madeira da ponte. Parecia normal. Olhei em torno. Bicho do mato nenhum surgiria para me amedrontar – eu possivelmente os assustaria. Mas e se tivesse um homem malvado, cruel, vil... o tal serial killer que minha mente criou na madrugada? No final das contas, não era nada. Ou talvez fosse uma ninfa querendo oferenda.

Ouvi um "crack" e me deu um medinho. Sou covarde

Peguei o caminho de volta e me preparei para os 3 km de estrada, às vezes poeirenta, a maior parte das vezes solitária. Transpirava e eu usava uma toalha que carrego comigo para atividades físicas outdoor. Era o caso. Foi útil. Botei os fones e fui andando. Mais uma vez, cantei alto. Não tinha ninguém na estrada. Ou quase. Uma hora cruzei com um cara empurrando bicicleta ladeira acima. Disse “boa tarde” e continuei a cantoria, como se fosse a coisa mais normal do mundo. Desde o instante em que o percebi na estrada, notei como me encarava.

Deveria estar com o rosto pintado de verde. Todos esses dias. Impressionante como sentia os olhares. Tinha momentos que achava que deveria estar com o som muito alto, embora os fones sejam daqueles que diminuem essa possibilidade (abaixei o volume várias vezes nestes dias de isolamento). Quando desembarquei em SFX, fiz uma pergunta ao motorista, que reencontrei verificando os pneus do ônibus, após minha voltinha pela praça. Agradeci a resposta e fui andando. Ele veio atrás de mim:

- É daqui?

- Não.

- Veio neste ônibus?

- Sim (e balancei a cabeça dando a entender “cumprimento e me despeço”).

Ele retomou a carga.

- Mas de onde é? Posso perguntar?

- Sou de São Paulo – respondi, afastando-me mais alguns passos (mantive o sorriso, porém; que horror ser antipática).

- Ah, desculpe. É que sou mineiro. E mineiro pergunta... Vai voltar para Monteiro?

- Não sei a que horas. Obrigada.

Era isso. Eu tenho cara de São Paulo. Devo ser como um extraterrestre. Ou como gente estressada que fica louca com o trânsito, xinga meio mundo e desconta no trabalho, onde fica trancada por horas remoendo a raiva do planeta. Deve ser assim que pensam nos paulistanos. Quando disse na pousada que vinha descansar, me olharam um pouco com piedade um pouco com um ar conformado: és um ET. Quando falei que queria correr na estrada, então cravaram. Sou de outro planeta. Um planeta em expansão, é verdade. E ao dispensar a bicicleta porque gosto de caminhar, pronto. Estava sacramentado. Eu não tinha jeito.

Ou isso ou nunca viram uma filha de bolivianos. Como a cor da Bolívia é verde – e eu sou palmeirense –, insisto: meu rosto deve estar pintado nessa cor.

Um companheiro na estrada

Meu pensamento se perdia nessas ideias quando cruzei com mais dois garotos de bicicleta. Bingo! Eles ficaram me olhando. Naquele instante não estava cantando alto. Ou tinha acabado a música ou não sabia a letra direito. Junto com eles, um cão amarelo e mirrado. Parecia ser deles. Não era. Já viram alguma vez na vida uma raça de cães que segue as pessoas com uma cara simpática como quem fala “Olá, amigo. Quer companhia”? Ele tinha esse jeito.

Tentei ignorá-lo. E se fosse dos garotos? Prossegui meu caminhar, mas o cachorro veio atrás de mim, nos meus calcanhares. “Ah, não vai me morder, hein”, observei mentalmente. Por telepatia, ele me respondeu. “De jeito nenhum, mas não finja que não estou aqui”. E acelerou seus passinhos para andar ao meu lado. Ficamos assim um pouco. Eu voltei a me concentrar na música e na paisagem. Então, o danadinho deu uma corrida e ficou na minha frente, meio de lado, meio me sondando.

Foi quando o observei melhor. Vi o corpinho magro e marcado por algumas feridas. Seus olhos doces me encaravam de um modo familiar. Lembrava... lembrava... Sim, Timão e Pumba. Verdade que era um cão e não um suricato. Mas tinha a cara do Timão. Então, eu o apelidei de Timão. 

Timão se apresentando. Solitários se encontrando

Fomos andando juntos desde então. Como o som dos fones preenchesse o vazio da estrada, praticamente não captava o movimento de veículos se aproximando às minhas costas. Tinha desligado o botão do medo de ser atropelada. Nem precisava mais. Timão funcionava como alerta. De repente, ele se encolhia e andava na parte mais encostada ao morro. Carros! E em certos momentos ele dava uma corridinha e parava temeroso, olhos grudados na estrada. Era uma moto. Tinha trauma de motocicletas, pelo visto.

Chegamos numa encruzilhada, que tinha um ponto de ônibus. Timão atravessou a estrada e foi para lá. Ri discretamente. “Vai esperar o ônibus?”. Ou iria pegar o outro caminho. Saquei a máquina e fiz fotos. Pela câmera reparei que ele olhou no meu rosto verde e se decidiu. Voltou para mim. Agradeci pela preferência. Andamos mais um pouco e chegamos à divisa com a cidade. Uma estrada cheia de pó. Foi quando nos separamos. Ele não suportou tanta poeira vermelha e correu pela grama verde, fugindo daquele caos. Eu continuei na poeira.

Enfim, estava na cidade. No tempo em que calculara. Senti o cansaço. Convenhamos: foram bem uns 17 km no dia, sendo 7 km de corrida. Meu tênis estava com algumas pedrinhas por dentro. Mas nem isso me incomodava. Cumprir metas é legal. Deve estimular endorfinas. Na parte de trás da praça central encontrei uma área para atividade física. Como se não tivesse andado tudo isso, fui para alguns aparelhos, para experimentar. Quando dei por mim, eu estava rindo como criança. Tinha subido em um que eles chamavam de “cavalgada” porque dava a impressão de seguir o ritmo da cavalgada. No Parque da Luz chama-se “esqui”. Cada cidade escolhe suas comparações.

Uma mulher com um abrigo de moletom veio me dizer que eu podia pegar informações com ele sobre atividade física. Ainda sorrindo das comparações, agradeci, mas disse que estava ali apenas por diversão. “Mas você já está se exercitando. Isso é bom”. “Acabei de voltar da cachoeira Pedro David. Acho que me exercitei bem”. Ou ela não me entendeu ou achou que fosse ET. Fez uma expressão de estranhamento. E disfarçou em seguida.

Ah, sim. Eu e minha cara verde. Ou talvez estranhasse que todos estavam de blusa e eu ainda estava de camiseta (pudera! Que calor deu a caminhada).

Tive de dar um tempo para poder voltar para minha pousada solitária (ônibus cumprem horários rígidos no alto da serra). Antes, fui tomar um cappuccino na Dona Xica, misto de loja de artesanato, cafeteria, revistaria e cachaçaria. Lugar muito agradável e o único onde pude me conectar em toda a cidade. Bendito wifi. 

Esperando o ônibus na praça central de SFX. Esperando para voltar para minha pousada, 20 km abaixo. E dando um descanso aos pés depois de uma longa jornada

Na estrada, no ônibus, com outro motorista (não o mineiro), fiquei observando a noite. Encarava os últimos 20 km do dia numa escuridão (verdade que ainda tinha os 3 km da pequenina rodoviária até a pousada). O ônibus, não sei por que, corria com as luzes internas apagadas. Em dado momento, num trecho da estrada sinuosa, com o ônibus correndo sem medo, vi um cartaz: “Verifique os freios”. Ah, que lembrete agradável. O que há com essa cidade que faz alertas que despertam fortemente a imaginação?! Que maneira de morrer, pensei, sem temor algum.

Olhei para o céu. Havia tantas estrelas... Elas estão sempre lá, mas as luzes da cidade grande nos impedem de ver esse espetáculo. O céu estava carregado de estrelas como as frutas maduras de um pomar. Gostei da comparação. E assim retornei à minha solidão.


Guardi le stelle

8 comentários:

  1. Nunca viajei sozinha, mas tenho vontade. Gostaria de ir para Ilha do Mel sozinha, em uma época inóspita!

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    1. Oi, Be. Fiz várias viagens sozinha. Tem gente que não gosta nem um pouco. Algumas vezes fiz a escolha por mim. Outras, não. É interessante para quem não se incomoda com a solidão. Tem horas que vc quer dividir opinião com alguém, mas se não tem jeito, paciência. Eu conversei com o cachorro. E cantei sozinha na estrada. Repeti, por exemplo, umas três vezes "Vivo de novo", do Gram. E tb repeti "Café com leite de rosas", do Marcelo Jeneci. Tinha a ver, sabe?! Se estivesse num carro, com alguém, provavelmente isso não aconteceria.

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  2. adorei. suas descricoes me fizeram sentir que estava lah, observando. aproveite bem seu tempo e tente nao temer tanto os bichinhos! bjbj

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    1. Tem gente que não se conforma por eu temer tanto bichinhos que são infinitamente menores do que eu. Mas não tem jeito. Sobe um arrepio pelas costas. Obrigada pelo comentário. Volte sempre! :)

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  3. Oi Lelê. Não sabia que você tinha um blog. Sou o oposto de você com as novas tecnologias: desconectada, desinteressada, impaciente. Mas foi bom te ver por aqui... Vou aparecer mais para ler postagens antigas - saber como você esteve e como você está. Saudades. Beijo.
    Bia (do Daniel)

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    1. Que bom, Bia. Apareça sim. Tb estou com saudades. Beijo

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  4. Lena, jah fiquei sozinha em hotel e tbem me lembrwi do Iluminado. Rsss. ÓTimo post. Bj.Andrea Martins

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  5. Andrea, sabe como é o nome do proprietário da pousada onde fiquei? Geminiano. Isso mesmo. Queria saber se o nome batia com o signo, mas resolvi não perguntar porque achei que poderia dar a impressão de intimidade. E isso eu não queria de jeito nenhum. Até porque não vi nenhuma dona Geminiana. Bjs

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