quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Duas ilhas


Já passou muito tempo desde meu último post. Não tenho a desculpa dos dias corridos. Foram corridos, sim. Porém têm sido assim: uma constante. Então, é o caso de fazer mais uma adaptação nesta vida.

Dias de verão em Ilha Comprida, um destino diferente do que estava habituada nos últimos anos.

Faz algumas semanas tirei uns dias de folga. Tenho umas horas extras para descontar e resolvi dar a chance de praia para uma parte da família. Não sei exatamente por que - ou até sei -, mas há um afã em se aproveitar o início do ano para o pessoal curtir sol e mar. Particularmente, acho que temos oportunidade de ir à praia em outras ocasiões porque calor é o que não nos falta. De todo modo, se o povo quer agora... eu me curvo.

Só que eu não queria ir ao nosso "tradicional" destino quando pensamos em praia: Ilhabela. Oh, sim. Somos esnobes. E só queremos praia de gente bonita. É uma brincadeira, só que neste ano estive um pouco sensível a isso. Ilhabela é um lugar lindo e gosto mesmo das praias. Em algumas delas tenho a capacidade de me abstrair e nem penso que tem muita gente ali que não me diz nada. Noutras, nem preciso disso. Fora da alta temporada, fica uma delícia. Mas em janeiro... fica lotada e, no meio da multidão, há gente com a qual não me interessa conviver. Pelo contrário, prefiro distância.

São 74 km de praias em meio à vegetação ainda nativa, com ventos que varrem  solidões. A estrada beira-mar é longa e há muitas áreas vazias. Muitas
E com essas praias largas o que não falta é guarda-vidas (nos coletes está escrito guarda-vidas, e não salva-vidas)
Achei curioso como tem placa de proibição por tudo quanto é lugar (pela preservação do ambiente) e chamou minha atenção, além da quantidade de guarda-vidas, a plaquinha de perigo. As pessoas podem se enganar com águas aparentemente tranquilas

Foi um pouco isso que pesou quando resolvi que, desta vez, iríamos para outro lado. Acabo tendo um peso considerável nessa decisão (e com isso "condeno" as pessoas a me seguirem). Eu não queria ter de andar de carro para ir à praia. Não queria gente esnobe. Não queria ambiente requintado. Eu queria simplicidade e despreocupação.

Bem, acabamos indo para Ilha Comprida, que tem 74 km de praia. Achei que seria interessante porque a região tem uma proposta mais ecológica. Há muitas praias para escolher. Além disso, a Ilha do Cardoso fica perto. E certamente estaria longe de gente esnobe. Bem, estivemos longe de pessoas assim. Ao mesmo tempo, eu me senti a esnobe.

Fiquei no centro, no Perequê (toda cidade praiana tem um Perequê, não é). Era a área da muvuca , mas de manhãzinha dava para ficar sozinha 

Melhor me explicar. Vou começar pela "recepção", que foi um pouco decepcionante. A viagem se alongou (erro de rota) e isso interferiu no humor geral. Ao chegarmos na nossa pousada, que fica no centro da Ilha, havia tantas pessoas na rua, tanto burburinho, tanta fuligem e sujeira (hello, é o centro da cidade!), tanta bagunça, que me espantei um tanto. E antes disso pegamos uma rua sem asfalto, em meio a várias outras sem asfalto. Deu a sensação de que voltava no tempo, quando o turismo parecia uma ideia distante de tudo.

Ainda há problemas de infraestrutura para encarar em Ilha Comprida. Então, não espere encontrar tudo que deseja. E é importante lembrar: a ilha  compõe uma área de preservação


É verdade que era um feriado (aniversário de São Paulo), o que enche a praia de gente. No meio disso tudo, eu me vi como aqueles personagens de filme que resolvem visitar a exótica Índia e caem no meio do trânsito e do caos. Era um pouco isso. Esnobe, esnobe, esnobe. Não condenarei ninguém se assim me chamarem.





Nós nos divertimos nas dunas, mas neste caso eu me refiro às menores. É que Ilha Comprida têm duas áreas com esses montem de areia. As maiores ficam no lado que fica próximo à Cananeia. Não dá para ir lá em determinados horários. Tem de esperar a maré baixar

A pousada estava ok. Tinha tudo que anunciava. A piscina era bacana, o que funciona muito bem com adolescentes. E no meu grupo havia três (ao todo, estávamos em cinco). Aí, resolvemos tentar jantar algo leve naquele mesmo dia da chegada. Não conseguimos. Paramos em um lugar que era misto de padaria com boteco. Eu tive de buscar a bebida e tive de aguardar os lanches no balcão. Um dos adolescentes - o menos encanado, diria - pediu que a partir dali a gente fizesse refeição "em casa". Concordamos. É duro você se sentir pouco à vontade em um lugar para comer.

A praia exatamente em frente ao nosso quarto recebia o Festival de Verão de Ilha Comprida: na primeira noite, teve Cidade Negra. Na segunda (a de cima) foi a vez de Paralamas. Gostei bastante do show

Mas depois desse início conturbado eu me reconciliei com a Ilha. Ela tem seus problemas de infra-estrutura. Falta planejamento. Não tem banco Itaú, o que nos afligiu um pouco (e não estou fazendo propaganda; é porque a gente precisava de fato). Tudo bem. Isso tem de ser uma batalha dos moradores e de quem frequenta e curte a região. Potencial tem.

Pulamos nas águas do Mar Pequeno. A cor é assim porque é a cor do rio, do mangue, da natureza

Um passeio de barco do outro lado da Ilha

Para me reconciliar, tive de entender a Ilha. Não é lugar para qualquer um. Eu, por exemplo, estava fora de contexto. Eu e meus preconceitos, me circundando. Eu estava ali como uma ilha. Até que encaramos melhor a vocação ecológica de lá. Vimos a beleza das dunas, a beleza do litoral com suas árvores compridas e a beleza do vento varrendo a areia das largas praias (o açoite do vento sobre a vegetação me lembrou da Patagônia). Curtimos o Mar Pequeno, o mangue e sua fauna. E gostei muito do horizonte infinito. A cor da praia não seduziu meus companheiros. A água do rio influencia no tom do mar: é mais escura, puxando para o marrom. Não houve jeito de mudar a opinião dos meus parceiros de viagem quanto à cor do mar.

Um horizonte comprido. É assim a Ilha

Pegamos um dos dias para visitarmos Cananeia e fazermos um passeio pela Ilha do Cardoso. O objetivo primeiro era ver golfinhos na travessia de barco. E vimos (as meninas ficaram encantadas). Depois era curtir a praia mesmo. Andamos por uma piscina natural, almoçamos, nos divertimos.

Um banco de areia no caminho para a Ilha do Cardoso
Um caranguejo na Ilha do Cardoso

Eu tentei fotografar os golfinhos. Mas não deu. Uma ave serve?

Um pescador da região que forma o Lagamar

Não seria justo comparar Ilha Comprida com Ilhabela. São completamente diferentes. Na vocação, no espírito. E isso é mais uma lição para mim. Não adianta querermos recriar realidades. Isso só nos leva à decepção. É preciso compreensão. E, depois, adaptação. Quem me ajudou a encarar a Ilha com outros olhos foi um guia da região. Jovem, rosto adolescente ainda. Ele explicou a Ilha, a região, quase explicou as pessoas. Desse modo, compreendi. Ou seja, antes de condenar qualquer coisa é bom estudar o que é aquela coisa. Você queria que ornitorrinco fosse pato? Pois bem: ornitorrinco é ornitorrinco, mesmo com aquela cara de pato.

A luta da cidade é pela preservação da natureza. Espero que consigam,  mas sem abrir mão de um bom planejamento. Afinal, turismo ecológico é uma proposta que pegou e que agrada muito aos gringos também

Outra lição é que os preconceitos vivem rondando a gente. Se não abrirmos os olhos, eles nos capturam, nos transformam, nos tornam ridículos. Eu fiquei com bronca da praia no centro da ilha estar com tanta sujeira. Isso poderia ter contaminado minha opinião sobre a Ilha. Mas decidi ser mais racional. Havia muita gente na cidade. E lá ainda era palco dos shows de verão - teve Paralamas do Sucesso em frente ao nosso quarto. Devo dar algum desconto pela temporada. Só não vou aceitar que essa situação seja um fato corriqueiro. Isso não dá para engolir.

No meio da corrida tinha uma garça
Todas as manhãs era acordada por passarinhos. Não esses, mas tem muitas aves na região

Não me arrependi da minha escolha (eu não perguntei isso para os adolescentes; esqueci). Aprendi alguma coisa. E me diverti. Até corri, o que foi difícil porque a areia é muito fofa (é um ambiente interessante, embora canse demais). Melhor é que não teve nada de esnobismo. A mais esnobe era eu. Então, quando percebi isso, tirei a carapuça de mim. Despi-me. Fiquei livre.

Escolhemos o caminho de Iguape para irmos à Ilha Comprida

Mais engraçado foi ter viajado para outro ilha alguns dias depois. Uma ilha que também nada tinha a ver com meus dias na praia. Nem com verão. Fui para Londres, naquela grande ilha chamada Reino Unido. Pretendia escrever algo sobre meus dias na casa da rainha. Porém resolvi que isso ficará para depois.

Vou voltar para a Ilha e para essa região. Quero conhecê-la melhor