terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Prepare-se para a São Silvestre de 2014

A São Silvestre de 2013 me trouxe bons momentos. Não me preparei como devia, e isso eu já contei no post anterior. Então, fui para a luta no espírito "correr e me divertir". Não ia fazer tempo mesmo. Não poderia correr abaixo de 6 minutos por quilômetro. Aliás, fiz bem o oposto. Pensei em me manter nos 7 minutos para tentar correr sem parar: 15 km de batidão. No ano passado eu não fiz isso. Por um erro de cálculo.

E na São Silvestre 2013? Vamos à prova.

1. Cheguei em cima da hora. Peguei metrô e coloquei o chip no tênis na estação mesmo. Fixei o meu número no peito e subi. Claro, já havia uma multidão. Então, nem deu para fazer um alongamento decente. Fui para perto do Masp. Fiquei numa área meio apertada, com dois grupos carregando faixas. Eu não conseguia ler de onde eram. Mas tudo bem. O locutor da prova ficou lendo diversos cartazes. Acho que levou uns 25 minutos para a gente começar a andar na Paulista. Realmente, era um mundo de gente (recorde de inscritos).

Largada. Nem adianta imaginar que você largará às 9h. Bote uns 20 minutos de espera até chegar à linha


2. Na largada, um corintiano chamado Mário quis me pagar R$ 1,50 por um minutinho de ligação para a mulher. "É em São Paulo?", perguntei. "São Paulo, sim". Era a segunda vez que corria - e pelo visto a primeira tinha sido há muito tempo porque ele tirou umas dúvidas comigo que até estranhei. Emprestei meu celular, mas não aceitei o dinheiro. Dali, ele me pergunta, sabendo que eu tinha corrido no ano anterior: "Dá para correr na largada?" Respondi o óbvio: não. "Quando dá para correr?". Disse que achava que a partir da Pacaembu dava para ensaiar um ritmo mais forte. "Tem muita gente", expliquei. Mário estava com um grupo divertido. Na hora do futebol (sempre tem essa hora), eles gritaram o nome da Lusa algumas vezes. Quando o locutor começou a citar os clubes e falou "Fluminense", muitos vaiaram. A massa não perdoa. E veio lá, no aquecimento, o comentário mais divertido: "Vou contratar o advogado do Fluminense e aí eu viro campeão da São Silvestre".

Descida em direção ao estádio do Pacaembu. Um bolo de gente. Na foto, tem até uma área mais livre. Mas não dá para disparar


3. São Pedro foi camarada e mandou umas nuvens pro céu no começo da prova. Mas o mormaço e o sol vieram detonar nossa energia. Corri no meu ritmo na Pacaembu, embora tenha dosado a velocidade. Senti que eu podia render mais. Mas lembrei do longo percurso e resolvi economizar. Descemos a avenida e com 3 km eu botei o boné na cabeça. Não dava para aguentar mais o sol. No km 4 veio o primeiro posto de água - só na avenida Paulista deu para encontrar água gelada; todas as demais vezes era temperatura ambiente. Eu tinha esquecido que no final da Pacaembu, quando a gente pega uma rua para virar em direção ao Memorial e assim cruzar a avenida, tem uma subidinha considerável. Primeiro desgaste forte. No km 5, joguei água no boné. Nas costas eu já tinha jogado. A temperatura corporal tinha subido bastante. Peguei a primeira ponte, aquela ao lado do Memorial.

A ponte perto do Memorial. Não é muito longa


4. A primeira ponte foi tranquila. Tinha gente andando e tive vontade de perguntar para essas pessoas se elas sabiam desse obstáculo. Acho impressionante que o mapa da organização, dado no kit do corredor, não tivesse essas informações. Havia sinalizações de "fácil", "médio", "difícil", mas não tinha nada do tipo "viaduto", "pirambeira" (piadinha). Chegar na Marquês de São Vicente foi piece of cake. Bico. Já a Rudge veio esquentando. Joguei mais água no corpo. E aí eu vi a ponte. Quase ri. Estava lá escrito: 8 km. Eu tinha calculado que ela estava por volta disso mesmo (vide o post anterior - clique aqui). Sou muito inteligente (piadinha). A ponte da Rudge custou. Ela nem é tão longa, mas exige força. Ela acaba, você suspira de alívio, mas vem mais uma subidinha.

Já a ponte da Rudge: ufa!


5. A essa altura você já viu os tipos mais variados. O cara que corre com a placa "Nunca completo uma corrida". A família unida: mulher, marido e criança no carrinho. Os sujeitos vestidos de metralha com um amigo vestido de policial, armado de cassetete, correndo atrás deles. O homem fantasiado de noiva. A mulher bancando a batgirl, toda coberta de preto (calor!). Perto da biblioteca Mário de Andrade fica a turma do Corinthians. Vi um torcedor do Palmeiras correndo com a bandeira e um senhor carregando uma réplica da Jules Rimet. No centro, reencontrei a Emília. No ano anterior, eu a vi exatamente no Ipiranga. Mesmo lugar. Incrível. É um cara que faz a festa do pessoal. Nas ruas, o povo grita "Emília, Emília". E ele acena. Até que corre razoavelmente bem, mesmo com toda aquela maquiagem, peruca e fantasia. Também no centro, levei um cutucão. Não tinha ouvido um cara avisar para abrir espaço para o cadeirante. Fiquei com vergonha. Pedi desculpas. E assim passou por mim um sujeito com ar de boliviano empurrando a cadeira de um homem jovem. Ao lado, vinham outros voluntários, acho que para revezar. De fato, na Brigadeiro mudou a pessoa que empurrava a cadeira. Falando em boliviano, no Viaduto do Chá avistei a barraquinha da Bolívia. Em 2012, eu passei perto deles e gritei "Viva Bolívia". Eles ficaram felizes. Então, fui até lá e corri a lateral inteira e gritei três vezes "Viva Bolívia". Eles ficaram muito entusiasmados. Naquele momento, eu corria forte. Eles acenaram com as bandeiras, repetiram o grito, aplaudiram e eu os deixei ainda fazendo festa. Deu-me orgulho.

6. Orgulho tive também por não ter jogado nenhuma garrafa, nenhum saquinho no meio da rua. Não. Eu carrego as garrafinhas e as jogo no lixo. Acho importante esse zelo. O pessoal jogar na lateral da rua, eu faço cara feia, mas ainda tolero. Se o corredor atira no meio do caminho, seja a tampinha da garrafa ou o saquinho de Gatorade, aí não aceito. É falta de respeito com o colega. No local onde pude pegar um saquinho de Gatorade (no centro) muita gente largou no meio da rua o saco ainda com líquido. Ficou aquela coisa grudenta no chão (se vejo uma mulher fazendo isso, fico ainda mais brava. Tenho a impressão de que mulheres são mais cuidadosas nesse aspecto, mas pelo visto devo mudar minha percepção). Sem falar no risco de acidente. Pisei numa garrafinha que quase me fez escorregar.

7. No km 11, oh-oh... Tive de ir a um banheiro químico. Impressionante. Já corri diversas provas de 10 km e nunca fiquei apertada. No ano passado, tive de passar no banheiro. Nesta São Silvestre também. O detalhe é que havia uma fila. Vi morrer toda a vantagem que eu estava construindo. Ok, nem era assim uma vantagem. Tudo bem. Aceitei o fato. Foi nessa hora que me atrapalhei e, em vez de retomar a corrida pelo Nike Running, eu pausei o sistema. Ah, que inteligência. Como eu corro também com o Nike Sportband (que conta minha corrida devido ao chip, instalado no tênis, ao qual o "relógio" está conectado), pude registrar minha prova direito. Faço esse esquema porque receio perder o GPS (no Nike Running).

8. Tirando essa parada, não interrompi minha corrida. Foi tudo na força das pernas, às vezes com ritmo mais intenso, às vezes com ritmo bem lento. Na Brigadeiro, por exemplo, em alguns momentos meu pace era tão modesto que mais um pouco virava caminhada (risos). Mas não desisti. Eu queria correr a Brigadeiro inteira. Eu corri. Uma hora eu olhei bem pra cima e senti que a coisa era loooonga. São dois quilômetros. Eu pensava: "faz de conta que eu tenho de dar uma volta e meia no Parque da Luz". Sei. Era uma volta e meia em subida!

9. Joguei muita água em mim na Brigadeiro. Pulsos, cabeça, costas, rosto. Eu tinha de baixar a temperatura. Eu me sentia uma caldeirinha. Mas faltava pouco. Era nisso que eu pensava. Ao vislumbrar a Paulista, deu emoção. Se não me concentrasse, chorava. Meti na cabeça que agora era hora de acelerar. Bem, uma coisa era a vontade. Outra era a energia. Acelerei um pouco, mas só quando comecei a ver o pórtico da chegada corri mesmo. Peguei o que sobrava e queimei tudo. No ano anterior, acelerei tanto que meu pace estava em 4. Desta vez, não rolou pegar esse ritmo.

A chegada: menos veloz do que no ano anterior, mas plenamente satisfeita. Corri toda a Brigadeiro. Eu a superei!


10. Ainda que tenha corrido o tempo inteiro (tirando os minutos na fila do banheiro), essa minha prova me custou quatro minutos a mais do que a do ano passado. Isso porque em 2012 eu estava mais preparada. Disputei mais corridas, treinei mais, corri distâncias maiores, peguei estradas, subidas, chuva, calor, areia, frio. Este ano eu não fui aquelas coisas. Tive diversos problemas pessoais.

Medalha bonita e merecida


O desejo para 2014 é disputar mais uma São Silvestre. Será a 90ª edição. Eu quero fazer parte dessa história. Não tenho ideia hoje de como irei me preparar. Mas tenho um ano inteiro pela frente para me planejar. Espero ter mais gente ao meu lado. Gente conhecida, quero dizer. Seria bacana ter amigos ao lado. Não necessariamente para correr o tempo inteiro grudado. É importante dar liberdade às pessoas - os ritmos são diferentes. Se der para correr junto, bacana. Gostaria dessa companhia porque a São Silvestre é a melhor corrida do Brasil. Porque é uma festa. Porque as pessoas - os competidores ou o público - celebram cada passo que você dá. Porque as pessoas estão juntas, independentemente de ter dinheiro, status, profissão, carreira, nome. Você é um corredor. E você faz parte do todo.

Já pensando na 90ª edição da São Silvestre


Feliz 2014!

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

São Silvestre: o pouco que sei

Mais uma São Silvestre está aí. Amanhã, por volta do meio-dia, espero estar em casa com mais uma medalha para a coleção. A largada será às 9h, pelo que está programado. No ano passado, houve atraso, o que me levou a começar a corrida 35 minutos depois do início previsto. É uma multidão passando pela faixa que cronometra os tempos. Nem vale imaginar que dá para disparar. Não dá.

Preparo para a largada (São Silvestre 2012)

Ano passado eu consultei um blog bem bacana que veio com dicas preciosas para correr. Era a minha primeira São Silvestre e eu queria fazer a coisa direito. Quer dizer, direito dentro do que eu tinha a oferecer. E acho que essa é a primeira lição para quem se inscreveu na prova. Em outras palavras, corra o que você pode. Não adianta forçar se não houve treinos suficientes, se não houve preparo.

Agora há pouco fui atrás de dicas para a prova - queria achar aquele blog, mas eu não o anotei (falha!). O jeito foi jogar no Google uma pesquisa básica. Encontrei textos que nem de longe foram inspiradores.

Bom, eu não tenho calibre para dar dicas valiosas. Mas digo o que aprendi da minha experiência. Desse minha única São Silvestre no currículo, a de 2012. E tem mais as provas que já fiz e que não sei mais quantas são (teria de pegar as medalhas e contar).

Então, vou enumerar o que me ocorre neste momento e peço perdão pela falta de recomendações mais técnicas ou detalhadas. Não pretendo ensinar o padre nosso ao vigário - tem 200 mil pessoas correndo muito mais do que eu (certamente elas devem ter orientações bem legais). E nem bancar professora para quem está ainda nas primeiras corridas. É só um compartilhamento de experiência.

1. Condições físicas - Treinou para a prova e pode encarar na boa os 15 km? Que bacana. Quem sabe eu consiga dizer o mesmo na minha terceira São Silvestre. Porque neste ano não deu de novo. E, devo confessar com certo lamento, que nesta edição estou menos preparada do que no ano passado. Em 2012, fiz mais provas, corri mais. Mas eu sei o que aconteceu comigo neste ano e lido com os fatos da maneira mais prática possível. Não deu para me preparar como queria. Vou partir para o plano de correr dentro das minhas condições: 10 ou 12 km sem parar. Depois, administrar. O que eu conseguir além disso é lucro. Se o caso for exatamente esse, o de falta de treinamentos, acho que o melhor é correr pensando em divertir-se. A prova é cheia de energia positiva, tem muita gente incentivando o caminho inteiro. Corra, olhe para as pessoas, viva o clima, curta e, se sentir alguma dor, avalie o que é e diminua o ritmo ou passe a andar. Não dá para virar super-herói na rua.

Se deu para treinar direito, legal. Não deu? Então, é correr sem forçar. E estabelecer uma estratégia para concluir a prova

2. Temperatura - Calor para mim é devastador (e para muita gente, claro). Corri recentemente em alguns horários quentes para me avaliar. Ainda não sei lidar com o calor. Talvez nunca aprenda a lidar com isso. Daí que sempre que tiver um posto de água, vou me abastecer para refrescar o corpo. Jogar água nos pulsos, no pescoço, na cabeça. Vou levar um boné na pochete (eu uso pochete nas corridas) e começar a correr sem ele para aproveitar ao máximo o vento enquanto ainda não aqueci muito meu corpo. Aí, com a corrida já me queimando e com o sol ardendo lá em cima, vou usar o boné. O boné aumenta minha sensação de calor, mas tomar sol no rosto esse tempo todo (quase duas horas de prova) está fora de questão. Vou jogar água sobre o boné e pronto. É minha saída para enfrentar a alta temperatura. Vou usar também um short de corrida que "esquenta" menos. Administre o calor também, portanto.

O calor cobra seu preço. Tem de esfriar o corpo durante a corrida. Use a água que puder

3. Acessórios - Roupa e tênis são importantes, óbvio. Espero que, mesmo que a pessoa seja uma "aventureira" na São Silvestre, ela escolha o tênis de corrida mais confortável que tiver. Não é hora de tirar da caixa o modelo novo que comprou pensando na prova. Se era para estrear um calçado, era melhor ter feito isso pelo menos um mês antes. Vou correr com um dos Nikes que tenho e que já usei algumas tantas vezes no Parque da Luz, meu lugar costumeiro de treinos. Sobre o short, já falei: tem de ser o mais fresco que tiver. Mas não precisa ser o mais curto. Tem nada de moralismo aí. É que tem de lembrar que o atrito nas pernas (e nas axilas, conforme li) pode irritar a pele lá pelos quilômetros dez ou 12 (o cálculo serve para mim). Tem gente que usa vaselina. Tem quem opte por um short mais comprido para proteger a parte das coxas que sofre mais com o atrito. Eu vou sair de casa com a pele bem hidratada, já que não tenho essa vaselina comentada pelos corredores. Na pochete, levarei, além do celular (com o app Nike Running) e do MP3, lenços umedecidos (pacote fininho) e uma tolha pequena (não gosto de ficar suando muito no rosto). É a minha maneira de correr. Eu uso óculos de grau e é impossível para mim correr sem. Não me sinto bem correndo com óculos escuros. Efeito psicológico puro. Por isso, pego um segundo par de óculos de grau (um mais velho) e se ele embaçar eu recorro à toalha. Em relação à camiseta, talvez eu use a da prova (que é da Adidas: boa!), mas pode ser que eu resolva vestir uma camiseta do Palmeiras. É legal correr com o seu time do coração.



Correr com a camisa do time pode ser bacana, se ela for do tipo que não esquenta. "Palmeiras, minha vida é você"

4. Trilha sonora - Tem corredor que prefere o silêncio ou o canto dos passarinhos no parque. Eu gosto de música. Nas ruas, eu também curto. Mas isso vale mais para corrida organizada. Se a pessoa vai correr na rua no dia a dia, aí sou a favor de ouvidos atentos. Abaixe bem o volume ou não bote fones. Melhor assim do que não ouvir um carro se aproximando, uma buzina, um alerta. Numa prova, dá para correr escutando música. Abaixe quando passar perto de uma aglomeração de torcedores. É legal a energia. Mesmo. Vou rechear meu MP3 de sons que estimulem a velocidade, mas alternando com músicas que me incentivem a diminuir um pouco o ritmo. Para equilibrar minha prova. Isso porque eu não consegui me preparar como gostaria, ok. Então, vou correr no embalo, mas sem forçar.

5. Percurso - Você já deve ter visto no mapa da organização. Se correu ano passado, sabe como é a coisa. Se não sabe, veja o trajeto e procure ler dicas de corredores experientes ou de treinadores. Mas vou colocar aqui coisas que não li na busca que fiz no Google. Todo mundo fala da subida da Brigadeiro. É o desafio, sem dúvida. Todo mundo chama atenção para o trecho final da prova, lá pelo km 12, 13. Mas tem dois pontos antes que merecem atenção: uma pontezinha perto do Memorial da América Latina. É quando a gente passa ao lado da biblioteca Mário de Andrade. E outra ponte, já na Rudge. Essa cobra do físico. Tenha consciência disso. Estabeleça sua estratégia! Isso me leva ao ponto seguinte.

6. Estratégia - Ano passado segui as dicas de um técnico (no tal blog cujo endereço eu perdi) e foi muito bom para mim. Então, desci a Pacaembu sem acelerar. É evidente que a descida "pede" uma passada mais rápida. Afinal, você é impulsionado a correr ladeira abaixo. Não faça isso. Não desgaste seu corpo logo de saída. Contenha seu ritmo (exceto se você for um atleta mesmo e está com tudo para fazer um belo tempo nos 15 km). A Pacaembu é uma estrada longa, como na música do Almir Sater. Deve dar uns 4 km até o primeiro posto de água. Dê uma maneirada. O sol é das 9h e pouco. Perto do Memorial você sente muito calor. Refresque-se. Aí, você faz um retorno e vai pegar a subida do elevado perto do Memorial. Não é um percurso longo, mas suba na boa. Não precisa forçar agora. A segunda ponte é mais puxada. Aí, você desce e vai numa reta. Vê as pessoas torcendo, vê os primeiros saquinhos de produtos energéticos. Vamos lá. Então, vem a ponte. Agora sim. Use a lenha que tem. Se você administrou bem a energia, a ponte da Rudge não será tão complicada. Se correu muito lá atrás, agora pode faltar perna. Essa ponte deve ser perto do km 8. Por aí. Dez quilômetros se completam no Largo do Arouche. No Largo de São Francisco são 12 km. Foi nesse ponto, no ano passado, que quebrei meu ritmo. Precisei ir ao banheiro (na São Silvestre, tem banheiro químico em todo posto para pegar água). No km 10 eu já estava apertada e segurei ao máximo. No posto de água do km 12, não deu mais para segurar. Ou seja, parei de correr e até recuperar meu ritmo... já era. Pena. No começo da Brigadeiro tem de valer seu plano para a prova. O que você estabeleceu para essa parte do percurso? Tente colocar em prática. Eu quero correr a subida da Brigadeiro. Quero subi-la inteira. Então, a partir do km 12 vou dosar minha energia para ter combustível para queimar nesse trajeto. É longa essa parte. No início da Brigadeiro, não olhe para o infinito. Não faça isso. E não olhe muito para os competidores que estão ao lado. Não se deixe influenciar por esses fatores. O momento é de concentrar na estratégia. Digo isso porque eu cometi erros no ano passado. Olhei para os competidores na hora em que comecei a subida. Não tinha ninguém correndo, só eu. Ninguém. Todos caminhavam. Olhei para o alto. Não enxerguei o fim da subida. Não conseguia adivinhar onde estava a Paulista. Isso me influenciou. Deixei de correr por muitos metros porque desejava entrar correndo na Paulista. Achei que não teria perna se ficasse correndo aquele caminho todo. Foi uma bobagem da minha parte. Eu tinha condições físicas, mas me deixei influenciar pelo psicológico. Então, foque na estratégia. Adapte-se aos resultados que você conseguir ao longo do percurso. Na metade do caminho concluiu que está custando muito? Reconsidere seu plano.

7. Paciência - Afobação nunca dá certo. Seja paciente na prova também. Solte o pé quando quiser, mas lembre-se de correr com inteligência. Afinal, correr a gente quer! Se está no astral, ótimo. Facilita bem. O lado psicológico pode pesar em certos momentos. Se você estiver no meio do caminho e desanimar porque está sentindo falta de força, de perna, diminua um pouco o ritmo. Mas não desista. Recupere seu fôlego, jogue uma água no rosto. Molhe os pulsos. Mude a música. Se for o caso, beba aqueles produtos energéticos de saquinho (se você nunca usou antes, não experimente na prova. De repente você enjoa). Pense na sua chegada na Paulista. Positive vibrations. Porém, se você se sentir mal durante a prova, pare. Procure auxílio médico. Tem ambulância em todo o trajeto (acho que de 500 em 500 metros). Um detalhe que soa engraçado: se te der vontade de ir ao banheiro, ora, vá. Vai quebrar o ritmo, mas paciência. Continue. O negócio é terminar. Aliás, falando em banheiro, esvazie a bexiga o mais próximo possível da prova. Como observei antes, correr apertado não é legal.

É isso.


Pernas pra que te quero

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Play it again, Sam: Isso nunca termina

Play it again, Sam: Isso nunca termina: O disco Reflektor do Arcade Fire é considerado um dos melhores de 2013, pela crítica internacional. Está na lista do Guardian. Está na da Rolling Stone...

domingo, 27 de outubro de 2013

Tudo se apaga tão rapidamente...

Hoje já não era um dia normal.

Acordei e senti isso. Algo no ar. Algo na luz. Eu... que coisa mais besta... mas eu sentia.

Saí pra correr acompanhada da minha irmã. Fomos ao Ibirapuera. Não havia sol como nos outros dias da semana. Tudo bem. Prefiro assim para correr. Fiz o percurso habitual. E mesmo sem ter aquele sol senti um forte calor, mas não era no corpo inteiro. Era como se me queimassem os pés. Eu maldizia as meias.

Mas ainda não era isso.

Voltei pra casa. Tomei meu banho. Aí veio um mal estar. Leve. Seria da corrida? Do calor que senti na hora?

Não era.

Deitei-me. Fiquei vendo House. Vários episódios. Uma morte. Outros pacientes quase à morte. House pegando sua guitarra e tocando.

Às vezes só a música salva.

Então, resolvi olhar algo na internet. Tinha terminado um episódio. Olhei. Parei. Não quis aceitar no primeiro minuto. Lou Reed morto?



Nessas horas tudo desaparece. Tudo some. Esqueço tudo. Meu cérebro me atingia com a frase "Lou Reed morreu". Como se eu e Lou Reed fossemos grandes amigos. Como se um dia tivéssemos tomado umas cervejas juntos. Eu menos que ele, certamente.

Em junho eu o encontrei. Lou Reed era um dos convidados super esperados do Festival de Criatividade de Cannes. Todo ano tem alguém da música no painel de uma rede de agências chamada Grey. Já teve Roger Waters, já teve Yoko Ano. Nenhum deles me fez ansiar tanto por esse momento quanto Lou Reed. Desde o primeiro minuto que soube que ele estaria lá eu quis entrevistá-lo. Como se entrevista alguém que você admira muito???

Difícil, bem difícil. Quem já se pegou nessa situação me entende.

No dia do painel lá estávamos nós, eu e Gigi (uma das minhas grandes amigas; temos várias afinidades, uma delas é a música). Lou Reed entrou no palco demonstrando uma debilidade que nos fragilizou a todos. Ele tinha feito um transplante de fígado em abril.



Foi uma hora de debate interessante. Fotos explodiram com ele, o mito, entrando. Fotos explodiram quando ele encerrou o painel. Ele foi aplaudido várias vezes. No final, leu um poema. Eu bebia tudo com os olhos. A gente via ele andando e aquilo doía. Pelo menos para mim doía. É muito triste ver um homem fraco assim, mesmo lutando, tentando, resistindo.



Depois disso, houve uma coletiva com ele. Mr. Reed teve de se sentar. Quer dizer, sempre havia cadeiras para os entrevistados se ajeitarem e falarem com os jornalistas. Mas a dele era diferente. Jenson Button e Ron Dennis (McLaren), por exemplo, ficaram em cadeiras altas, rindo, exibindo cores no rosto. Lou Reed se instalou, afundou um pouco na cadeira, apoiou seus braços nos encostos e respondeu aos jornalistas. Por vezes era ácido. Tudo bem. Parecia que todos ali estavam se sentindo intimidados. Seria por ele estar visivelmente convalescente? Seria por que todos tinham admiração e timidez diante do astro? Seria por que ninguém se julgasse à altura? Podia ser tanta coisa.

Eu estava ali, esperando meu momento. Queria fazer apenas uma pergunta. Estava aguardando a hora em que as perguntas morressem. Havia questões meio bobas. Havia questões um pouco fora de contexto. Alguns jornalistas pareciam querer demonstrar conhecimento demais. Lou Reed os jantava todos. Eu disse da acidez? Perguntaram o que ele fazia para se manter criativo. Respondeu de pronto: "eu me masturbo todos os dias". Depois de mais um comentário carregado de sarcasmo, ele projetou a voz com mais força: "ei, vocês não têm humor?". Risos nervosos soaram pela sala. Éramos como crianças diante do mestre. Não, não creio estar exagerando.

Então, surgiu minha oportunidade. Peguei o microfone. Tinha pensado nela por causa da música "Perfect Day". A assessora de imprensa apontou para mim. Era minha vez. "Mr. Reed, what´s a perfect day for you... these days?" Eu abaixei o microfone e ele respondeu quase imediatamente. "Today". As pessoas aplaudiram. Ele olhou para meu rosto e senti muito profundamente que a resposta era mesmo para mim. Ele tinha entendido minha pergunta. Eu tinha entendido a resposta dele. Tive a sensação que iria derramar lágrimas ali. Mas segurei. Acho que aplaudi também. Não tenho mais certeza dos meus gestos. Ele completou a resposta para minha pergunta. "Gosto de encontrar gente. É importante ver o rosto das pessoas que amam música".

Caramba, aquilo era para mim? Teria visto ele que eu sou dessas pessoas? Provavelmente não. Não tenho essa importância, eu sei. De todo modo, fiquei abalada naquele instante. Tinha sido forte para mim. Lou Reed se foi pouco depois. Eu tinha coisas para fazer. Corri. Passei o dia correndo. Depois soube que o pessoal da imprensa do Festival de Cannes tinha perguntado a meu respeito. Queriam me agradecer pela pergunta. Disseram que tinha sido perfeita.



"Today". O dia perfeito é hoje.

Penso nisso agora. O dia perfeito só pode ser hoje. Mesmo que ele seja ruim. Basta refletir que a resposta foi dada por uma pessoa que passou momentos muito terríveis. Momentos para derrubar. Um transplante de fígado é algo tão... ora, apenas imaginem... E ele estava em um festival falando com um monte de gente que o aplaudia, que o admirava. Estar vivo, depois da nevasca, do temporal, da tragédia... isso é uma dádiva. Reconhecer isso é importante.

E é engraçado que, diante de tudo isso, lendo sobre a morte dele, revivendo aquele momento em que nós nos encontramos num átimo de segundo que nada representou em sua vida - enquanto que para mim representou muito -, vejo formiguinhas andando na mesa. Formiguinhas minúsculas. Daquelas que você se pergunta de onde surgiram. Olhei para uma delas que, atrevidamente, subiu na tela do laptop enquanto eu escrevia este post. Ela me ignora totalmente. Eu posso esmagá-la. E assim sua existência se apagará. Num gesto. Num segundo.

Puuft. E acabou a vida da formiguinha.

Ela não sabe quem é Lou Reed. Ela não sabe quem sou eu. Ok. Deixo que ela se vá.

A vida continua. É certo. Mas tudo pode se apagar tão rapidamente... Um brinde a você, Lou Reed.



A primeira que ouvi dele...




Quantas duzentas mil pessoas já não cantaram "Perfect Day"? Ela embalou dois casamentos de amigos muito queridos.


Mais um dos hits de Lou Reed.

E outro...

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Hora de se preparar para o que falta

Mais um mês acabou. Essa virada de calendário ressalta que o ano também está acabando. Logo as pessoas vão combinar a festa do réveillon, se é que já não estão. Confesso que tenho um tanto de "medo" dessa proximidade do final de ano. Essas coisas de Natal me deprimem. E não é de hoje. Virada, então... mesmo com todos os festejos, os fogos, os desejos de um novo - e bom - recomeço... não sei.

Deixando essa parte de lado, final de ano lembra a hora dos planos. Tempo em que as pessoas pensam no que gostariam de fazer na próxima temporada: emagrecer, ganhar mais, trocar de emprego, conquistar um amor. Também é o tempo de conferir o que se fez. Afinal, você emagreceu? Recebeu promoção? Cargo em outro lugar? Alguém se enamorou de você? Fez o pedido de casamento? Casou? Aprendeu finalmente a surfar? Ou tocar violão?

Agora, neste minuto em que escrevo, toca Jorge Drexler e ele canta: "ya estoy en la mitad de la carretera". Bom, com outubro começando, o caminho já está bem pra lá da metade. E ele continua cantando: "lo que tenga que ser, que sea".

O que tiver de ser... que seja (mais uma corrida no Parque da Luz)

Não tinha feito nenhum projeto específico para 2013, o contrário do que aconteceu no ano anterior. Eu simplesmente adotei a filosofia de Jorge Drexler, sem saber. O que tiver de ser, que seja. Então, eu me pego aqui sem a necessidade de ajustar planos ao calendário. Como não tinha feito nenhum de verdade, sinto-me desobrigada. Para ser honesta, lá atrás, em janeiro, pensei em tentar estabelecer uma meia maratona como meta, mas deixei para avaliar até agosto. Não consegui me incluir nesse plano. Em agosto eu não estava legal. Outro desejo que tive - esse no meio do primeiro semestre - foi viajar para Londres, o que já se cumpriu. Nesse sentido, estou sem metas. Livre feito passarinho.

Talvez por essa falta de comprometimento com planos prévios esteja absolutamente confortável em estabelecer o que quero para este resto de 2013. Vou voltar a correr a São Silvestre. Fiz minha inscrição. Comecei a me preparar. Por enquanto, o ritmo de retomada está piano, piano.

Ao longo do meu histórico de corridas, iniciado em janeiro de 2012, devo ter ficado umas cinco semanas sem correr. Não semanas seguidas. Era sempre um buraco entre semanas. Um hiato. Porém, recentemente, tive duas semanas seguidas sem correr e eu senti muito a volta. Ok, ok. Não estou voando. Mas todo recomeço é meio devagar.

Recomeço devagar... Tudo bem. Recomeçar é importante. Aqui, um descanso pós-corridinha rotineira (5 km)


Neste domingo que passou, 29, disputei mais uma prova e foram 11 km. Epa, 11? É que uma das marcas patrocinadoras, a Rexona, teve a ideia de propor um quilômetro a mais aos corredores para quem apoiasse o ginasta Arthur Zanetti, medalha de ouro nas últimas Olimpíadas. Fiquei a metade da corrida pensando se iria encarar o quilômetro extra. Vou ou não?

Tinha na cabeça que esses mil metros a mais não me custariam muito. Se me perguntassem em agosto, eu não toparia. Em agosto, minha prática estava tão abandonada e irregular que corria uma vez por semana. Desde que decidi encarar a São Silvestre, na segunda metade de setembro, coloquei as duas corridas por semana nos eixos. Logo vou passar para três. Por isso, como já estava nesse espírito, fiquei namorando a ideia de alongar a prova.

Evidentemente, tudo dependeria da minha performance durante. Larguei sentindo-me estranha. Já tive saídas muito melhores. Pés leves, corpo suave. Dessa vez, os pés pareciam mais pesados, como se reclamassem da obrigação de carregar toda minha estrutura. Estranha sensação. Não tive alterações de peso significativas nos três últimos meses. Então, não sei o que foi aquilo. Por isso, larguei um pouco encanada. Outro detalhe importante é que, por uma atrapalhada minha, entrei no grupo dos corredores metidos a profissionais. Opa, escrevendo assim soa ofensivo. Mas não é isso. Estava na turma dos "velocistas". Entrei por uma passagem e quando vi já era... "Vamos lá correr com os papa-léguas", pensei na hora.

Não que eles larguem muito diferente. Não percebi grandes diferenças. No início, tudo é igual. Um mundo de gente se espremendo e controlando as passadas para não atropelar ninguém. Ao menos é assim para mim. Você larga devagar, o caminho vai se abrindo e você começa a acelerar quando passa aquela multidão. Eu faço desse jeito. Não gosto de correr forte na muvuca. Primeiro porque parece exibicionismo. "Saiam da frente, seus lerdos". Sempre tem alguém que faz isso, como se fosse The Flash. Segundo porque posso atropelar alguém. Isso me soa até como falta de educação. Ou de atenção, no mínimo.

Uma largada diferente. Não a largada propriamente dita. Mas a maneira como larguei: Circuito das Estações - Primavera. Na região do Pacaembu. Último domingo de setembro

Corrida é algo que você faz com você, mesmo estando na multidão. Quer dizer, não sou do tipo que vai disputar pódio. Então, não olho para o lado, pensando que posição vou pegar, quem vou ultrapassar. Ultrapassagem, aliás, é só naquele instante secreto em que você mira alguém mais devagar no trajeto e estabelece para si que deixará esse alguém para trás. Isso para diversão.

Ao mesmo tempo, enquanto se corre, os olhos estão abertos. Você vê o caminho, as pessoas, os esforços. Correr é muito interessante.

De volta à prova do domingo, a primeira desde que resolvi disputar a São Silvestre, o Circuito das Estações. Costumo dizer que os três quilômetros iniciais são aqueles que, para mim, o corpo cobra, dizendo que não preciso correr. Sinto essa chamada. Meu organismo não entende por que decidi submeter meu corpo a tamanho desgaste. Depois disso, ele se aquieta e compreende que não adianta protestar. Em geral, é assim comigo. Na prova, essa resposta veio no km 2. Tive a largada estranha, corri, ouvi as reclamações internas, prossegui, acelerei, veio a aceitação.

Daí, terminei a avenida Pacaembu e peguei a viradinha. Ah, a viradinha...

Esse trecho é o início de uma subida puxada. Você sai do plano e pega a rua na ascendente. Que grau de inclinação. É forte. Falam da Brigadeiro. Se toda a Brigadeiro fosse como essa rua, tinha gente infartando no finzinho da São Silvestre. Vá lá, um exagero. Mas ela custa. Você só ouve gente bufando. Nessa hora, também pode surgir algum The Flash Super Fantástico, que acelera tudo e procura demonstrar que ele é o bom.

Beleza, eu também gosto de subida. Gosto de acelerar um pouco, mas é um pouco. É meu desafio pessoal. Posso estar cansada, porém se vejo uma subidinha (poucos metros) isso me dá um pique. Meu cérebro diz: "vai". E eu vou. Essa subidinha, entretanto, eu respeito. Mantenho o ritmo. Em seguida, surge o viaduto, o Minhocão. Ida e volta deve ter quase cinco quilômetros de percurso.

Viadutos não são linhas retas, caminhos planos. Há subidinhas e descidinhas. A gente tem de estar preparado para isso. Por duas vezes, em corridas passadas, acabei andando no Minhocão. É porque não sabia o quanto ele cobrava. Agora que sei, vou no meu ritmo. Sem bancar a superatleta. O negócio é manter a corrida.

Uma prova no Minhocão no ano passado. Subidas e descidas no caminho. Pela foto nem dá para sentir o real esforço que se faz. Eita, que correr aqui, sem parar nem uma vezinha sequer, não é bolinho

Na corrida de domingo, não parei nenhuma vez. É uma satisfação pessoal. Ninguém está ali do seu lado para você virar e dizer: "consegui. Não andei nenhuma vez. Venci o viaduto de novo". Poderia até andar na avenida, devido ao cansaço. Mas ali eu tinha vencido. E isso importava mais.

Depois do viaduto, era vez de pegar aquela rua de volta, não mais como subidinha. Na descida, me ensinaram, você controla seus movimentos. A tendência é acelerar. No entanto, é preciso concentração. Não vá arrebentar suas pernas, seus músculos, seus joelhos porque você deixou o corpo desembestar. Lembro de um corredor que disputa pódios para ganhar dinheiro (eu o conheci numa prova no centro de São Paulo). "Ah, na descida eu corro mesmo. Aproveito. Mas eu sei correr. Estou acostumado", disse-me.

Eu estava no começo dessa descida e surgiu a placa para quem iria encarar o quilômetro extra. Resolvi que ia encarar. Estava embalada. Ora, tinha vencido o Minhocão. Se nos primeiros metros do viaduto eu tinha sentido o esforço (maldita subidinha), assim que pegara o caminho de volta tive a sensação que eu tinha gás para mais. Fui, animada. Algumas pessoas aplaudiram a empreitada. Mas, nossa, se eu soubesse.

Havia outra subidinha nesse um quilômetro a mais. Percebi na hora em que comecei a descer a rua. Vi as pessoas fazendo o retorno. Muitos andavam. "Cacilda, deve ser um trecho puxado de subida", imaginei. Era. Enquanto descia, passei a dosar a energia, preparando-me para a parte em que seria muito cobrada. Relaxei os ombros. Vamos lá.

Que subida. Você vai até lá embaixo e recomeça. Ladeira íngreme é o que vinha à mente. Fui subindo. Primeiros metros, beleza. Depois, as pernas pesavam muito. Força, força. A respiração acelera. A temperatura do corpo sobe. Você transpira, transpira. Arfa, arfa. Você vê um daqueles tapetes que registram sua passagem. Vai, corre. Mantém. Não desanima. Vai... O ritmo diminui. Sua fraquela! Vai. Falta mais um pouco.

Aí, qualquer trecho mais plano você comemora. Sem fôlego. Mas comemora.

Mais uma medalha para a coleção. Esta contou com um quilômetro extra no final

Completei minha prova com esse quilômetro a mais. Quando faltavam 200 metros para terminar eu só pensava no momento em que pararia de correr. Visualizava. Em momentos assim parece que 200 metros são 500. Mas depois é a glória. Cruzei a chegada, desacelerei. Coração na boca, transpiração molhando o rosto, respiração aceleradíssima. Alguém da equipe médica me olha. "Você está passando bem?". Balanço a cabeça. Paro perto dela. Controlo a respiração. "É, tenho de me preparar mais. A São Silvestre tem quatro km a mais do que fiz hoje", imaginei. 

As subidinhas foram boas para me testar. Gosto delas. São desafiadoras. Elas me aniquilam. Mas eu dou conta delas.

Correr nem sempre é fácil. Isso que dá felicidade logo no primeiro minuto não é uma verdade absoluta. Concluir a meta do dia, porém, é realmente prazeroso. Às vezes o percalço é duro. Mas se você conseguiu, ora, parabéns!

Então, é isso. Não tinha nenhum projeto para 2013. Agora, aos 40 minutos do segundo tempo, estabeleci o que quero para este ano. Quero fazer a São Silvestre inteira, bonitinha, sem parar no caminho como no ano passado (tive de fazer uma pausa porque fiquei apertada e usei um banheiro químico instalado no trajeto... maldição! Isso quebrou meu ritmo).

Para isso, preciso me preparar. A hora chegou. Tenho meus planos. Agora é treinar.

Boa sorte a você com seus planos, caso ainda tenha de cumpri-los. Tem tempo para isso. Reorganize as metas (ou a meta). Esqueça o que ficou pra trás. Já é passado. Estude. Coloque objetivos práticos na missão. Anime-se. E vamos em frente!


sábado, 20 de julho de 2013

Fio branco

Do Huff Post (leia em http://migre.me/fxZdF) - Grace Lehman
Healer, writer and artist (b. 1950)
"I never dyed my gray hair. I never associated it with age. I always associated it with the art of being"

Estava tomando um banho sem aquela pressa do meio da semana quando deparei em minhas mãos com um fio branco. Inteiro, da raiz à ponta. Eu o apreciei com certo vagar. Esse é um verdadeiro sinal dos tempos. Um fio branco. Testemunha bioquímica do que já acumulei de histórias.

Lembrei que pouco mais de um mês atrás eu tinha me deparado com outro fio branco solto assim. Eu estava fora do País, trabalhando. Ao sentar-me para batucar um texto, reparei no espelho que havia defronte. Não tinha como não reparar nele. Olhei-me. Tirei uma foto e postei uma brincadeira no Instagram. As pessoas gostaram. Falaram do corte novo. Do ar jovial manifestado na imagem. De fato, aparento ser mais jovem do que sou. Não é algo para se gabar tanto assim. A gente é o que a gente vive. E não pretendo aparentar ter vivido menos (nem mais) do que vivi. O mais importante, acredito, é que, de um modo geral, vivi bem os anos que passei. Não me encanei com isso da idade. Não aos 30, nem aos 40. Vamos ver se aos 50 permanecerei incólume.

Mas eu falava do fio. Postei a tal foto. Recebi comentários rapidamente - o povo do Brasil é madrugador. Tinha de sair para fazer entrevistas. Então, ao me levantar, reparei naquela "linha" prateada solta sobre a minha calça. Peguei na mão. Não era linha. Era um dos três fios brancos que conseguia enxergar na cabeleira. "Bem, estou com um a menos".

A tal da foto no espelho: com um fio branco a menos na cabeleira

Esses dois mínimos, quase ridículos acontecimentos me fizeram voltar para o passado. Época em que meus pequenos tinham a idade da inocência (pequenos é minha maneira de falar. Eles já votam!). O filhote era um menininho cheio de ideias. A filhotinha era uma criaturinha de derreter corações só com o olhar cristalino e esperto, acompanhando o irmão-herói (era a fase do irmão-herói) em brincadeiras, atitudes e argumentos. Estavam os dois no quarto que dividiam. A gente ficava às vezes juntos na cama, vendo algum desenho e conversando sobre a vida, dentro da perspectiva que eles tinham (e havia cada conversa boa).

Porta-retrato: os filhotinhos na idade da inocência

De repente, o filhote me encara e diz surpreso que eu tinha um cabelo branco. A filhotinha, que é mais jovem, levantou-se e me olhou, com carinha indagadora, tentando entender a surpresa do irmão e buscando minha resposta. As consequências da questão escapavam ao seu entendimento, tão pequena era ainda. "Ah, um fio branco. Não é nada demais", respondi. Ele me perguntou por que tinha surgido aquele fio. Expliquei da maneira que julguei correta. "Porque estou envelhecendo". Seguiu-se uma transformação no rosto do menino. Primeiro um misto de choque. Depois de angústia. "Arranque", rebateu, com uma voz que parecia conter raiva. "Mas por que? Eu não tenho problemas com este cabelo branco", continuei, divertindo-me. Então, ele se atirou em mim, abraçando-me à beira do choro. "Não quero que você envelheça". Então, compreendi. Ele estava com medo de me perder. Estava com medo de que eu envelhecesse porque assim me aproximava da morte.

Conversamos sobre isso naquele dia. Eu e as crianças. Pedi que não se assustassem com isso. Que às vezes um fio branco surgia até antes do tempo. O filhote ainda insistiu mais um pouco que eu arrancasse aquela coisa. A filhotinha seguiu o irmão. Expliquei mais um pouco sobre minhas crenças. "A gente não precisa arrancar. A gente só precisa entender que a pessoa está vivendo mais. E vivendo mais tem mais cabelos brancos. Se viverem que nem o vovô, que é forte e está sempre contando histórias pra vocês, está muito bom".  Mostrar que meu pai estava bem foi importante para que eles aceitassem esse processo chamado envelhecer. Poderia ter falado que pintaria meus cabelos para disfarçar? Sim, mas eu não queria pintar. Afinal, era apenas um fio. E minha relação com os dois sempre foi de sinceridade (jamais usei mentirinhas para convencê-los de algo). Essa é uma virtude valiosa para a gente.

Mais um porta-retrato: eu e os filhotes, uma relação de sinceridade. Não escondo o que penso. Apenas explico (adequando apenas as palavras à situação e à idade). Desde que eles eram bem pequenos é assim

Tenho apreço pelos meus fios brancos. Não pretendo pintar os cabelos. É o que venho pensando nos últimos anos. Por que esconder-me atrás de uma tinta? Gosto de avançar no tempo. Isso se refere a mim, a meu jeito. Envelhecer pode ser muito ruim para alguns. Para mim, é um fato inevitável. Então, não entrarei em guerra contra esse processo. O que posso fazer é viver bem. E para viver bem tenho de tirar proveito do que consigo fazer hoje: ler muito e deixar a mente afiada, correr e manter o corpo em dia, comer decentemente e evitar problemas de saúde pela frente, beber um vinho ou uma cerveja de vez em quando e cultivar os prazeres da vida no cotidiano... É dessa maneira que enxergo a coisa.

Não sou exatamente uma pessoa vaidosa. Prezo mais o "ficar confortável e sentir-me bem comigo" do que "quero ficar bonita e impressionar". Claro, tenho minhas manias. Meus cuidados. Minha estética. Não uso muita maquiagem. Quando quero usar, em geral é batom. Curto anéis, brincos e colares. Um lenço. Creme para hidratar a pele. Filtro solar (preciso lembrar mais disso). Um perfume suave. Tênis, jeans e camiseta. Meus óculos. São coisas tão simples. Eu prefiro assim.

Então, quando pensei nos meus cabelos brancos, decidi que não iria camuflá-los. Eles são até meio feios. Grossos, meio tortos, desalinhados. Mas eu os deixo lá. Não quero arrancá-los, nem pintá-los. Estou bem comigo em relação a eles. Deixem que me lembrem que vivi histórias.

Cada um tem seu processo. Não estou aqui para dizer que o meu é o mais certo (embora as pessoas ganhem mais seguindo minhas opiniões... piadinha). Não estou dizendo que tudo é legal em envelhecer. Mas espero esse avançar do tempo de maneira suave. Sei lá se um dia faria botox, por exemplo. Realmente, não tenho rugas de preocupação por isso. Melhor assim ;)

O fio branco dizendo: estou aqui. Meus cabelos aqui parecem mais claros do que são. Efeito da foto. Eles são escurinhos mesmo. Sem tinta, sem luzes, sem reflexos... Somente reflexões

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Quando os dias são difíceis



Foto - Lena Castellón
Subterrâneos da Quinta da Regaleira (Sintra). Fotos: Lena Castellón


Não adianta insistir muito.
Forçar sentimentos.
Parecer legal.
Melhor é assumir nossa dificuldade. Há dias que você sente como se não devesse vivê-los.
Deveriam simplesmente se desvanecer no calendário.
Na folhinha eles sumiriam. Você olharia para o papel e veria o espaço vazio.
Você teria a certeza, então, do sentimento. Não se questionaria tanto. Apenas saberia: este é um daqueles dias. Desassossego.
Talvez fosse mais fácil encarar seu espírito. Não ficar brigando tanto com suas entranhas, seus meandros cerebrais, suas veias.
Mas a vida não permite isso, o espaço vazio. O calendário está lá. E as horas transcorrem.
A existência, numa situação dessas, é como o ar dentro de um saco de papel. O saco se mantém de pé. O ar está lá, sem que ninguém perceba. Não se desespere, porém.
Se o dia está difícil, o melhor é andar.
Não falar. Escutar. Ou até silenciar. Mover-se por ação da gravidade, quiçá.
Também respirar. Observar. Respeitar-se.
Não se impor nada que não exista. Sim, é verdade: não forçar.
Não se magoar. Não se torturar. E se ninguém te entender... para quê? Às vezes não é isso que importa. Há momentos em que você não busca o entendimento dos outros. Você quer apenas ficar recolhido.
Se for assim, recolha-se.
O dia passará.
Até lá, bote uma música.
E ande...


Foto - Lena Castellón
Você pode concordar em partes. Pode discordar totalmente. Mas andar é importante. Eu sei.






quarta-feira, 22 de maio de 2013

Cozinhar é fácil. Difícil é arrumar a cozinha

Ando às voltas com questões domésticas. Desde que decidi dizer "adeus, obrigada" à dona Maria, a mulher que vinha todas as quintas arrumar minha casa, tenho investido num processo que deixe meu lar com cara de lar... arrumado.

Sei que escrevo aqui sobre corrida, música e cultura pop, entre outros assuntos, muitos deles inúteis. Mas hoje o tema é mais básico. Fico me perguntando que geração estamos criando. Ah, não se trata de dúvidas filosóficas, dilemas sociopolíticos, preocupações ambientais. Não. Eu disse: o tema é básico.

Analisando a zona de guerra que, por tempos, se instaura na sala da minha casa, imagino se, como eu, outras pessoas estão falhando na educação de crianças e adolescentes no sentido de prepará-los a manter uma casa em ordem. Ou vai ver eu sou a única a errar aqui. De todo jeito, primeiro vamos ao mea culpa.

Não sou uma mulher que se desespera com a limpeza e a organização. Claro que desejo uma casa perfumada, asseada e em ordem. Mas não agonizo se vejo um par de meias esquecido na virada da noite para o dia. "Vá lá. Ficou com preguiça, Depois, quando acordar, pega e leva para a lavanderia", imagino, no momento "boa vontade". Outro exemplo: ver uma pia com louça para lavar no dia seguinte também não me atormenta (quem nunca fez isso, especialmente depois de um jantar com amigos que terminou bem tarde?). Além disso, jamais serei aquela mulher que anda pela casa com um produto de limpeza e um pano na mão para tirar resíduos praticamente invisíveis a olho nu. Prefiro ações concentradas - "vamos num levante arrumar essa bagunça" - a atitudes contínuas, sem parar, quase paranóicas para tirar a sujeira da frente. Relaxe, gente! É o que defendo.

Talvez por isso nunca tenha sido rígida nas cobranças para colocar "ordem na casa". Não sou mulher para ficar gritando "arrume essa bagunça" na porta do quarto. Eu peço. Uma, duas, três vezes. É minha maneira de viver (não gosto de gritos). Pois agora, com dois adolescentes maiores do que eu vivendo boa parte do dia em casa, percebo que deveria ter sido um tanto mais enérgica.

Não entendam mal. Esses adolescentes são ótimos. Têm bom coração e valores elevados, tudo o que eu mais queria. São companheiros e inteligentes. Mas demoram a captar algumas urgências. Tipo jogar lixo. Virou ladainha minha dizer que não colecionamos lixo. Isso porque frequentemente os adolescentes esquecem que é necessário retirar os sacos de lixo e colocá-los nos cestos do corredor do prédio dentro do horário indicado pelas regras do condomínio. Esquecendo, fica lá o saco fechado no cesto da lavanderia, como se fôssemos iniciar uma coleção. Porque é desse modo que ironizo o esquecimento.

Por isso é que acho que, se você tem um filho pequeno (sete a dez anos, mais ou menos), tem de se preocupar desde já em formá-lo para os cuidados da casa. "Ah, que horror. Meu filho cuidando da casa?", pode pensar alguém. Mas isso está longe de ser um horror! Porque a gente precisa preparar o filho pra vida (e agora me imaginei falando que nem o Fábio Porchat). Sim. Uma hora ele tem de sair de casa, não é?! E digamos que ele não ganhe essa fábula toda para contratar uma empregada ou uma diarista. Pois então! Deveria fazer parte da educação da garotada o "saber cuidar da casa". Não como se fosse aquela estudante do século XIX sendo preparada para casar. O que sugiro é educar a criançada para um dia perceber, por conta própria, que é preciso limpar a sala, lavar a louça e guardá-la, jogar o lixo, manter os sapatos guardados, mostrar que a roupa não se lava sozinha - e que, aliás, roupa mancha se for misturada sem atenção na máquina. Essas coisas.

Foto da página do Facebook chamada Ready Set Clean

Estou dizendo isso porque conclui que cozinhar é fácil - a criançada até tem interesse em fazer uns quitutes com a mãe, tipo cupcake. Difícil é arrumar a cozinha! Ou mostrar para a molecada que é preciso arrumar depois a "bagunça" que a gente faz. Inclusive na cozinha, depois de toda aquela alegria fazendo o cupcake.

Vamos às dicas que dou, com a experiência de quem, a essa altura do campeonato, tem de ensinar as "artes da arrumação da casa" a dois adolescentes já aptos a votar e que ainda desconhecem umas tantas nuances dessa vital lição. Tudo isso porque fui relapsa no passado (e pensar que eu tive minha mãe me colocando na "lida" quando eu era criança; sábia dona Emma).

- Lavar louça - tarefa simples, não? Pegar uma esponja (ou bucha, você escolhe como quer falar), o detergente e esfregar na louça, certo? Calma, calma. Há peças da louça que engorduram muito facilmente. Demais até. Cabo de talher que for de plástico, então. Aliás, tudo de plástico. Você sabe disso, né?! E seu filho? Sabe? Não. Por isso, ensine. Quando for lavar a louça, separe por categoria. Ah, coisa chata! Categoria? Mas funciona. Separe os pratos em pilhas (rasos, fundos, pequenos...). Peças de plástico devem ficar longe de panelas e outras louças engorduradas. Panelas também ficam separadas. Talheres, de preferência, junte tudo para lavar numa tacada só. Organize, portanto, a pia antes de iniciar o trabalho. Eu acho mais fácil começar pelos pratos, que vou empilhando no escorredor de louça. Daí, parto para os plásticos (o lance da gordura). Em seguida, copos, talheres e panelas. Tem de chamar atenção para a gordura. Please. Senão vai ser uma luta depois para convencer seu adolescente que aquilo está mal lavado. E tem de explicar que, depois da louça lavada, deve-se  limpar a pia. Parece óbvio? Pois bote seu adolescente com a missão de lavar a louça do domingo, por exemplo. Talvez ele não perceba que a tarefa inclui a pia.

Frame de vídeo do site da marca Scotch-Brite 

- Roupa - um dia, sabe-se lá por que, você precisará que alguém lave as roupas pra você. Pode ser que a diarista faltou e você tem de viajar no dia seguinte e está sem tempo. Ou não tem grana pra lavanderia. Ou o marido ou a esposa viajou e você está só... Enfim, você vai precisar de alguém. Daí, resolve pedir para o adolescente. Não é nada demais, afinal. "Basta colocar para lavar que você logo, logo chega e estende. É só para dar um adianto, ok?" Exemplo simples. Comum. Se não passou por isso, você um dia passará. Aí, você liga para o seu adolescente, que nunca antes se perguntou como as roupas são lavadas, e pede para ele quebrar o galho. Passa as instruções. Acha que explicou tudo direitinho. E as máquinas são tão modernas, não?! Praticamente lavam sozinhas as roupas. Calma. Não se iluda assim tão facilmente. E se sua máquina estiver balançando demais e seu adolescente ficar desesperado com aquele barulhão e ele apertar a "pausa", ou o botão que interrompe lavagem, tirar o plug da tomada por causa daquela confusão toda e você, chegando em casa, se deparar com aquele mundo de roupa ainda mergulhado na água? E se ele botou sabão demais? E se esqueceu o amaciante? E se juntou na mesma lavagem uma calça azul que solta tinta com uma camisa branca, aquela que você comprou tem uma semana? Pois é o que eu digo: não levamos a criança para ver como fazemos nossas tarefas domésticas e daí, quando chega na adolescência, fase em que tudo é boring, ela não presta atenção direito (isso porque você obviamente é "chata"). Ou, voltando para a questão da roupa, o caso é outro: você pede para estender. "Vou deixar lavando, Pedro Ernesto. Volto daqui a duas horas. Você estende a roupa para mim, por favor?". E vem de lá, do quarto, aquela voz desinteressada: "tá". Aí, quando você volta, as peças não estão estendidas (duas horas dentro da máquina, Jesus! Ou, pior, o dia inteiro!). Ou estão todas lançadas sobre o varal, de qualquer jeito, ou os pregadores seguram as roupas das formas mais esdrúxulas que você já teve a oportunidade de conhecer na vida. É culpa do Pedro Ernesto? Ah, um pouco sim. Porque adolescente tem preguiça. Não negue! Você já teve também. Mas a boa parte da culpa é nossa, se não dividimos com nossas crianças o trabalho que dá cuidar de uma casa.

- Mesa da cozinha - não sei quanto a vocês, mas não consigo entender em que ponto falhei na educação das crianças. Porque, ao que parece, elas não entendem que a mesa da cozinha não deve ficar com todos os produtos e peças que você usou durante o dia. Açucareiro? Pote do Toddy? Caixa do suco (vazia. Ou pela metade e fora da geladeira, o que dá ainda mais raiva)? Migalhas do sanduba? Ô, meu pai. Se a mesa da sala está desarrumada, com cadernos, fone de ouvido, uma revista e mais o laptop largado, isso não me incomoda tanto. Paciência. Organizemos. Mas aí você passa o dia inteiro trabalhando e entra na cozinha para providenciar o jantar e dá de cara com aquela mesa tomada de coisas. Não é uma boa recepção. Então, já ensine desde pequeno: "a mesa da cozinha é uma parte muito importante da casa, meu filho lindo. Por isso, não deixe o copo aqui, tá. Coloque na pia." "Tá tomando leite com chocolate, Maria Cristina? Que legal que você já é crescida e faz seu próprio leite, acho ótimo. Mas não esquece de guardar o Toddy, tá. Não, você guarda! Não posso guardar tudo para você, linda."

- Banheiro - tudo bem. Não serei tão radical quanto minha mãe que me botava para lavar o banheiro com ela toda sexta-feira, dia de faxina pesada. Era eu chegar da escola e tirar o uniforme para vestir uma roupa velha e correr a ajudá-la na arrumação da casa, que só acabava de noite (sim, de noite. Ela ia para cozinha cuidar do jantar e eu meus irmãos íamos tomar banho). Ok, sem provas de fogo para a garotada hoje. Mas a criança - e o adolescente - tem de saber que o piso do banheiro tem de estar seco! Ou, pelo menos, não-molhado. Tudo certo até aí? Repito: isso tem de ser de pequeno. Criançada tomou banho, saiu limpinha, com a tolha no corpo e sorriso largo. Ah, que lindos! "Bom, mas você puxou a água do piso do banheiro? Sei. Agora você não quer porque ainda está molhado e está sentindo frio? Pois volte, pegue o roupão, feche bem fechado, amarre com o cordão e pegue o rodo para tirar toda essa água que você esparramou. Ah, tem de ser agora, sim. Que pena, né?! Ah, você está cansado. Tadinho, meu amor. Eu também estou. Mas volte lá e seque o banheiro. Não precisa passar pano que essa parte eu faço por você. Eu te ajudo. Tá bom assim, Nando?".

- Meias - isso merece um capítulo. De novo, faça um exercício e volte ao passado. Você já foi criança e adorava andar de meia pela casa. Eu, pelo menos, adorava. Seu filho também gosta. Mas não adianta explicar que dá o maior trabalho lavar meias impregnadas de sujeira. Mesmo que esse trabalho seja da dona Maria, pegue seu filho um dia e junte as meias, aquelas bem pretinhas de tanto andar pela sala, pela varanda, até pela cozinha. Lave seu filho para o tanque. Que horror, que horror. Calma. Peça para ele esfregar até tirar aquela sujeira. Se vai funcionar, eu não sei. Talvez continue a andar pela casa de meias, pouco se importando com o trabalho que dá. Mas ao menos você tentou. Outra lição importante: peça para ele recolher as meias - e as demais roupas - do quarto e levá-las à lavandeira. Não recolha você e não permita que outra pessoa recolha. Aliás, deixe de lavar as roupas do moleque e nem as coloque passadinhas no guarda-roupa. Faça com que ele entre em pânico ao perceber que não tem roupas! Aí, você diz muito calmamente: "isso é para te mostrar que você complica muito minha vida por atirar suas meias em qualquer canto: na sala, debaixo da cama, até na estante, Luiz Paulo. Então, é assim. Já que você não tem de lavar a roupa, então, demonstre seu reconhecimento pelo trabalho feito e  pelo menos entregue a roupa suja direitinho, tá bom. De preferência, entregue direto no cesto" (ah, quanta dureza neste meu coração). Por que eu falo de meias? Porque elas somem! Elas desaparecem e, com sorte, você encontra nos lugares mais loucos. Debaixo da cama é básico. Adolescentes têm esse hábito de jogar debaixo da cama. Acho que até colecionam lá uns pares. Ou uns pés (porque aparentemente o objetivo é desparear as meias). Mas a coisa não termina aí. Você encontra as meias, lava, estende, recolhe e... pede para o adolescente guardar. Guardam? É que dá preguiça juntar os pés e guardar os dois bonitinhos... E, então, eles amontoam tudo num bolo só e te procuram num dia em que você está correndo, atrasada, e te param para perguntar onde tem meia.

- Guarda-roupa - outro trabalho cão, que me leva a pensar que falhei na educação. Vá lá, ter um armário mega organizado não é fácil nem entre adultos. Mas mostre, por exemplo, que não se joga de qualquer jeito a roupa passada. "Ah, não. Por favor. Respeite sua mãe." É que, no meu caso, sem ter uma passadeira (passadeira, pra mim, é tipo mordomo. Nunca tive), sou eu que cuido de passar a roupa. Desde que meus adolescentes eram bebês essa tarefa sempre foi minha. Aí, você vai levar as mudas limpas para os quartos dos adolescentes e encontra as camisetas passadas todas jogadas, mal dobradas, largadas, amontoadas, amassando. É de dar nos nervos. Em casa, eles já passaram uma ou outra peça. Ficou um serviço ruim. Ok. Agradeça a ajuda. Mas eles têm de aprender. Então, um dia, chame seu adolescente (porque ensinar a passar roupa só pode ser para adolescente) e mostre como se faz, chamando atenção que certas estampas "queimam" e borram a camiseta, que tem diferença de tecido, que tem jeito de passar camisa, a manga da camisa, as dobras, essas coisas. Hummm, você não sabe nada disso?! Não sabe como ensinar? Você, adulto, nunca tentou passar uma roupa? Bom... melhor aprender. A gente nunca sabe o dia de amanhã.

Detalhe importante: se você já perdeu a "janela de oportunidade" para educar seu pequeno para as tarefas domésticas, então procure ser prático com seu adolescente. Não adianta falar e falar e falar. Não dá certo. Monte uma planilha, que você ajusta a toda semana, com as tarefas que cabem a ele e a você. Porque não se deve transmitir a sensação que agora é "tudo ele". Não. Tem de ficar claro que cuidar da casa é um trabalho de todos. Não está dando certo uma determinada tarefa (jogar lixo, por exemplo)? Estude uma nova estratégia. Não desista. "Ah, você está esquecendo do horário. Bote um despertador para tocar uma hora antes do prazo do condomínio se encerrar". Cobre-se também. Vire para ele e diga: "nossa, era para eu ter feito as compras e eu não fiz. Desculpe. Estou em atraso com minha tarefa". Se for preciso, troque a atividade porque um dos dois - ou dos três ou dos quatro, conforme o tamanho da família - não poderá cumprir naquela vez (tem uma prova importante, por exemplo, e precisa estudar mais). Mas troque já fazendo uma adaptação. Se na semana não pode colocar roupa para lavar, na seguinte, além de colocar a roupa para lavar, ainda vai cuidar das compras do meio da semana. Pra compensar o esforço do outro que o substituiu.

Detalhe importante 2: essas minhas dicas não são para todos os casos. Pense no que você precisa realmente. Pense no que está vendo diante de seus olhos (tipo, a zona dos brinquedos espalhados pelo chão do quarto do pequeno). E crie suas próprias estratégias. Fundamental é não deixar o tempo escapar e encontrar lá pra frente um adolescente irritado com suas chatices... Porque aí fica mais difícil ele adotar algumas práticas. O mundo é um tédio, lembra?

Detalhe importante 3: por que as marcas de limpeza não criam tutoriais para aqueles que querem saber arrumar uma casa sem ter muito trabalho (lições práticas que economizam tempo)? Ah, você acha que elas fazem isso bem. Nein, nein. Tem umas dicas, com uma listinha de "to do". E umas abas com conteúdo a ser publicado ainda. Pegar uma pessoa para mostrar como dar conta de uma pia cheia, com vídeo, com fotos, passo a passo, ah, isso não vi.

sábado, 11 de maio de 2013

Renato Russo, ainda espero...

Vi o filme "Somos tão jovens".

Eu sempre quis um filme sobre o Renato Russo. No dia em que ele morreu, escrevi um texto no qual dizia que a gente um dia ia se encontrar depois que a neblina passasse. Era algo assim.

Renato Russo, o mito. Crédito: www.legiaourbana.com.br/ricardo junqueira

O filme que tenho na cabeça não é igual a "Somos tão jovens" - e tampouco será como "Faroeste Caboclo", que está para entrar em cartaz. Na verdade, nenhum filme será igual ao que imagino. Acho que deve ter outras pessoas pensando o mesmo, com suas narrativas rolando pela mente. Claro que me refiro aos fãs. Gente querendo fazer filme e que nem era tão fã assim pode enxergar na figura do Renato Russo a oportunidade de criar um longa capaz de atrair multidões. Quem é muito fã já deve ter criado um filme mirabolante na imaginação.

Falo que teria gente nem tão fã querendo fazer um filme sobre ele porque Renato Russo virou um mito. Até quem detesta Legião vai reconhecer isso. Aliás, um dia me surpreendi que um cara que eu admiro estivesse entre esses que não suportam a música da banda que ainda é a mais popular do Brasil (quer dizer, tem outra??? Ajudem-me a pensar porque agora não me ocorre nada).

É lógico que não vou censurar esse amigo por não gostar. Primeiro porque ele tem um ótimo gosto musical. Tem tanta informação que eu devo ficar quietinha quando se trata de discutir música - ou nem tanto porque também sei um bocado. Segundo porque eu respeito a diversidade, mesmo quando alguém me diz curtir Xuxa (ecaaaaaaa!). Não, calma. Xuxa, não. Tenho de respeitar mesmo?! Tudo bem. Faço careta, mas me calo. E o problema definitivamente não é meu.

Mas voltemos ao Renato que é muito mais agradável...

Minha história com a banda começou quando meu irmão mais velho ganhou um LP em uma promoção da rádio Fluminense FM. Eu não sei como ela pegava em São Paulo, só que meu irmão ouvia e o som era ótimo. Então, sortearam um disco de uma banda nova e ele ganhou.

Lembro da gente pegando o álbum branco em casa e tirando o vinil do plástico, aquela sensação fantástica de ter um disco novinho. Eu não conhecia a banda e foi até meio estranho ouvir português no rock. A gente estava na fase de descobertas de novos sons, todos gringos. Havia aquela troca de fitas, emprestadas ou gravadas por amigos - mais ou menos como "Somos tão jovens" mostra. Então, sabíamos alguma coisa da música que tocava nos EUA e no Reino Unido. Aqui, mal sabíamos de bandas de rock brasileiras.

Essa é a imagem da capa do primeiro álbum: "Legião Urbana" (1985). Crédito: www.legiaourbana.com.br

Legião, eu diria, foi a primeira banda de rock de verdade que nos pegou no Brasil. Falo da minha família. Não da geração (aí, que cada um responda por si).

Tinha gostado bastante do som. "Soldados" eu devo ter tocado até furar o disco. "Ainda é cedo" também. Mesmo "O reggae", tão menos popular... E evidentemente aprendi a cantar "Geração Coca-Cola" e tudo mais. Ao contrário da turma de Brasília, como o "Somos tão jovens" sugere, nós não estávamos tão por dentro de que a ditadura era um negócio que ainda latejava. Por mais que meu pai fosse bastante ligado em política - e sempre foi - e nos apontasse os caras da Arena (o partido de direita que apoiou os militares) como gente da pior espécie, a consciência política que brotava nas letras da Legião eu não tinha. Mais: tem o fato de eu ser apenas uma adolescente quando eles já estavam tocando, bebendo cerveja e se apresentando por aí.

(Por sinal, uma coisa que me impressionou um pouco no filme foi ver como os jovens da turma do Renato Russo bebiam muito. Eu sempre fui caretinha. Não tenho discurso condenando bebida e bebuns, não. Mas minha primeira cerveja foi quando já estava na PUC - e foi num sujinho da Ministro Godoy, num sábado depois da aula e eu achei aquilo a maior amargura - o paladar era infantil... Ah, que fique claro que hoje sou uma entusiasta da cerveja. A minha pode ser red ale. Eu gosto das ruivas.)

Muito bem, então eu me liguei na Legião Urbana desde o primeiro momento, desde o primeiro instante em que o vinil saiu do plástico. Queria ter visto mais shows da banda, mas sendo caretinha, filha de mãe durona e quase sem dinheiro nenhum, eu só tive mesmo uma oportunidade. Já trabalhava (estava na Folha de S. Paulo) e tinha um show da Legião no Palmeiras. Fui até lá comprar ingressos para mim, para minha irmã do meio e esse meu irmão mais velho, o que ganhou o disco. Mal entrei na fila do guichê e descobri: ingressos esgotados!

(Ô, sina!!! Brasil, você muda e cresce, mas vira e mexe fico engasgada com isso de não conseguir os ingressos que quero porque um mundo de cambistas leva bilhetes de baciada.)

Estava tão espantada e sem enxergar saída que um cara percebeu minha situação e se aproximou. Era um cambista, que logo me vendeu três ingressos. Que presteza, não?! E a coisa era tão armada que o sujeito do guichê viu a cena e deu de ombros. Nem para alertar que isso não ia dar certo. Porque não deu certo. Lógico que eu não suspeitava que não daria certo. Os ingressos eram falsificados. Mas...

Alguém lá em cima queria que eu visse a Legião Urbana. Fomos ao show eu e meus irmãos e encontramos uma fila colossal. Sem brincadeira, creio que nunca mais encontrei uma fila para show tão grande quanto aquela. Dava uma volta no estádio do Palmeiras. A gente chegou de táxi por um lado e teve de contornar o quarteirão inteiro tentando entender aquela muvuca. Em dado momento, meu irmão pegou a gente pela mão e nos enfiou no meio da fila. Isso mesmo. Fizemos aquilo que eu condeno tanto: furamos a fila.

Horrível, não?! Mas isso nos ajudou, confesso. Ao chegarmos no pessoal da organização, eles, que pareciam seguranças, pegaram nossos ingressos. Um homem, com a luz negra na mão, segurava o papel, checava e dizia em voz alta, para outro sujeito ouvir: "falso, falso, falso". De novo fiquei surpresa. Meu cérebro demorou para processar que eu tinha comprado os bilhetes de um cambista desgraçado e pilantra. E eu lembrava da cena: ele sacando os bilhetes e me mostrando e o cara do guichê fazendo pouco caso, como se fosse tudo bem. O segundo sujeito, lá na entrada do estádio, nos empurrou para um canto e eu continuei estupefata. "Falsos?!", repetia para mim. Meu irmão nada falou. Mas minha irmã pegou a gente pelo braço e... mudou a direção, de forma apressada. "Vamos!" Realmente, ninguém se preocupava conosco. Os "seguranças" pegavam outras pessoas na fila e iam tratando assim, aos empurrões. "Falso. Falso" (devia ter rolado uma enxurrada de bilhetes falsificados).

Ainda estava prestando atenção nisso quando minha irmã insistiu. Corremos com ela para dentro do estádio. Ninguém notava a gente no meio da balbúrdia, com as pessoas - com ingressos verdadeiros - andando rápido para pegar o show inteiro (foi muito tempo perdido na fila). Aí, paramos numa segunda barreira, com uma mulher pedindo nossos ingressos. Como os caras nos devolveram os bilhetes falsificados, a gente apresentou exatamente o que tínhamos na mão, sem falar nada. Fomos liberados. Isso mesmo. Foi tudo errado, atrapalhado, confuso. Mas, no fim, deu certo.

Entramos. Avançamos pelo gramado, corremos até o palco. A gente se ajeitou num canto e de repente começou o show. Foi fantástico. Víamos o Renato Russo de perto, ouvíamos o que ele dizia, sua interação com o público, conhecemos músicas que eram novas na ocasião. E havia muita gente hipnotizada, encantada. Foi uma apoteose.

Renato Russo em show no Metropolitan (RJ). Crédito: www.legiaourbana.com.br/ isabela kassow

Saímos de lá felizes. E cansamos no caminho de volta para casa, a pé. Não é uma distância longa do Parque Antarctica ao Bom Retiro, onde morávamos. Mas o stress esgotou a gente.

Toda essa história demonstra como sou ligada à banda e ao Renato Russo. Muitos anos depois, comprei um livro para saber da vida dele. Li, curti, emprestei. Vi diversas reportagens a respeito dele. Sou uma fã realmente. Com a vantagem de entender algumas coisas daquele tempo. Somos, eu e ele, integrantes de uma geração (a diferença de idade é de oito anos). Os novos fãs talvez não captem certas nuances da história. Ou não. Pode ser que eles sejam bem espertos e informados e eu queira apenas me gabar de ter vivido na mesma época que o Renato Russo.

Um filme bom, mas longe de ser o que eu queria. Normal...

Ao ver "Somos tão jovens" fui transportada a um tempo que conheci. Minha irmã caçula, que também adora Legião, é dez anos mais nova do que eu e não deve ter percebido o clima daquela época do surgimento da banda (ela era uma criancinha). O ator que interpretou Renato Russo provavelmente também não sentiu isso na pele como eu, embora ele tenha feito um poderoso trabalho de imersão. Consegui ver o músico nele (ligeiramente forçado em certos momentos, na minha opinião).

Não é um filme perfeito. Achei bom. Não mais do que isso. Há momentos em que parece meio sessão da tarde, confesso. Mas resgata um período do Brasil (resgata ou apresenta, dependendo do grau de conhecimento de quem vê). Tem o mérito de trazer de volta essa atmosfera do início dos anos 80, que era um pouco perdida, um pouco em busca. Quem éramos nós, afinal?

Thiago Mendonça interpreta bem o Renato Russo jovem. Muito verossímel

O longa tem bons atores. Conta uma história direitinho e inventa um personagem para ser ponte para a complexidade do jovem Renato Manfredini Jr ("Ana", uma mulher que representa diversas amigas). Só que, na hora em que imaginava ver Renato Russo tornando-se o cantor das multidões (sem comparações com Orlando Silva, ok), o filme acaba. Parece pedir uma continuação. Mas também não fornece elementos que preparem o espectador para uma continuação. Por que foram botar no fim o vídeo real de uma música tocada no Circo Voador? Não precisava disso. Gerou-me esta impressão: "até aqui é filminho, agora é documentário, coisa real". E o vídeo ainda foi longo. Nada contra esse registro da realidade. Como fã, gosto. Só que ele tem de estar inserido no contexto certo, não para deixar gente "felizinha". O objetivo foi esse? Agradar com um bônus?! O longa é uma ficção, não um documentário. Não necessita de apelações.

De todo modo, se pensaram em fazer "Somos tão jovens 2" eu sou contra. Um bom filme sobre Renato Russo não deveria ter sequência. Tem de ter princípio, meio e fim. Não estamos falando do Homem de Ferro, ora (ops, eu adoro o personagem!). Trata-se de um homem de carne e osso, que viveu, amou, apaixonou, sofreu e morreu. Começo, meio e fim.

Outros filmes podem ser lançados. Gostaria de vê-los, se surgirem. Ainda espero que façam um filme que me diga quem foi ele e como ele se foi. E que mostre a tristeza que senti quando Renato Russo morreu, dando-me aquela sensação de que o mundo será mais justo se a gente um dia puder se encontrar. Palavras de uma fã.