Meus progressos são bons, julgo. Podia estar melhor? Sim. Mas venho fazendo tudo por minha conta, seguindo orientações aqui e ali. Pegando dicas com amigos e, sobretudo, correndo com cautela. Não quero forçar barra nenhuma. O objetivo é chegar em dezembro em plenas condições de correr 15 km sem sofrer com uma dorzinha misteriosa ou sem ter de torcer para não sentir reflexos de um problema que tive lá atrás.
Gosto de correr no Parque da Luz.
Minha prática cotidiana no Parque da Luz me satisfaz bastante. Primeiro porque peguei o gosto de correr. Sim, faz bem. Depois porque curto valorizar meu bairro. O parque pode se chamar “da Luz”, mas é tão do Bom Retiro quanto do bairro vizinho. Está no limite. Ou na intersecção, como queiram (ainda se usa escrever “intersecção”? Dúvida).
Claro, sinto os sacrifícios. Esse negócio de acordar às 5h20 durante a semana não é legal. Explico. A maioria dos amigos sabe que eu acordo cedo mesmo. Muitas vezes em torno das 5h. Mas acordar é uma coisa. Sair para fazer algo é outra coisa. Há momentos em que não tenho vontade de me arrumar para correr no parque naquele horário. Só que eu me obrigo a sair até 5h45 para poder aproveitar melhor o tempo que tenho. Vou falar que sair às 5h45 já significa sair em cima. Mais um pouco e atraso meu dia.
Acho que passei agora pelo maior sacrifício em relação à corrida. Já falei aqui que estou me tratando de depressão. Creio que falei rapidinho, sem entrar em maiores detalhes. Não pretendo abrir tanto minha intimidade. O fato, porém, é que nestes dias tive uma recaída inesperada. Quer dizer, eu não esperava ter tamanha recaída. Foi pouco depois de ter voltado de Buenos Aires (mais abaixo contarei da minha corrida na capital portenha). Poderia pensar que, após um final de semana bonito e agradável, teria uma ótima semana. Mas não há jeito de entender o que se passa com a gente.
Um dia senti que não podia fazer mais nada. Era uma quarta-feira. Meu abatimento foi tão forte que desejei não sair de casa. O celular soou às 5h20, avisando-me que era hora de me preparar. Não quis fazer nada. A razão dizia: “levante-se antes que você se atrase para a corrida”. Mas o coração pesado e triste me jogava para baixo. O relógio mostrava o tempo escoando. Não tinha forças para reagir. E eu tinha reunião e trabalho pela frente.
Como sou muito responsável, arranjei uma maneira de arrastar meu corpo para fora da cama. Entendam: isso não tem nada a ver com preguiça. Era como se eu estivesse mergulhada numa escuridão petrificante, que me segurava, imobilizando pernas, braços, que sugava quase toda minha energia. Consegui vencer a prostração e fui à terapia (tinha horário marcado já). Conversei sobre isso lá. Confessei que por pouco faltei à consulta. Eu tinha duas naquele dia e disse que iria desmarcar a segunda por me sentir doente. “Não estou bem”.
Saí da terapia um pouco melhor. Tinha o desejo de mudar o quadro e acreditei que no dia seguinte seria tudo diferente. Antes de pegar o táxi rumo a minha reunião, percebi que tremia de frio. Minhas mãos estavam muito geladas. No entanto, era um dia de sol e calor. Devia ser efeito da depressão. Lembrei de Harry Potter, quando a autora fala dos dementadores. Era aquilo mesmo. Havia um dementador sobre mim.
Cena de Harry Potter em que um dementador suga o ânimo de Duda Dursley (primo de Harry)
Veio a quinta-feira e de novo sofri com as consequências da depressão. O desânimo absoluto se instaurou de novo. Não é fácil enfrentar esse mal. Mesmo medicada, seguindo a terapia, comparecendo às consultas... não é fácil vencer o problema. Espantoso como a química cerebral interfere tanto em nossa vida. Resultado: não fui correr. Eu me maldizia. Era uma grande frustração. Mas não adiantou ficar me recriminando tanto. Não consegui superar a depressão. Levantei-me apenas para trabalhar.
Por que eu conseguia reagir para trabalhar e não para correr? Devia ser por causa da consciência de que o trabalho é obrigação e que dele depende o sustento de três pessoas (eu e os filhotes).
Na noite de quinta-feira, fiquei mentalizando que correria na manhã seguinte. Fui para cama cedo e tentei ver programas leves. Antes, forcei-me a comer um pouco (com a depressão a vontade vai embora; pelo menos no meu caso). Amanheceu... e fui derrotada mais uma vez. O dementador estava lá. Deu um certo desespero quando saí para trabalhar. Lembrei-me da psicoterapeuta tentando me incentivar a superar aquele quadro. E tive o receio de ter comprometido minha meta.
It was hard, but I was harder. Sábado! Consegui. Acordei cedo. Vi um pouco de TV (o desfile da Mancha Verde no carnaval). Tomei café. E consegui. Coloquei a pulseira do Nike+, levei o celular e acionei o aplicativo RunKeeper (sou meio exagerada nesses controles). Arrumei os fones e parti. No começo, tive dúvidas se daria para fazer meu circuito normalmente. Não nego. Foi mais custoso. Na semana eu tinha corrido apenas na terça-feira (6 km).
Espero não ter outra recaída. Gostaria de dispensar logo o tratamento. Nem posso tomar as tantas cervejas ofertadas por amigos e outras pessoas (de repente venho sendo chamada para sair de um jeito que nem imaginava). Mas, obediente que sou, dispenso esse tipo de encontro. Não posso beber mesmo. Quando for liberada, ah, vou querer logo partir para um pub. Será um brinde especial a tudo que superei.
Mi Buenos Aires querido
Antes de falar da capital argentina, vale o reforço: a corrida tem me feito bem. Pude, por exemplo, dormir melhor. E o fato de dormir pouco era algo que preocupava meu médico. Então, encaro o exercício não só como uma rotina que me dá prazer e boas condições físicas. É mesmo um remédio para me tirar do quadro depressivo. Um reforço. Ainda mais porque faço em lugares abertos. Outdoor total.
Recentemente fui para Buenos Aires a trabalho. Não tive muito tempo para passeios. Mas não me queixo. Passar o final de semana em Buenos Aires é sempre bom. O sábado foi um dia cheio. Tive a pretensão de correr 6 km. No sábado anterior eu tinha superado os 10 km. Puxa, em Buenos Aires não iria fazer seis? Claro que sim. Ah, quanta pretensão.
Minha corrida portenha foi no circuito que a cidade inclui num programa de esportes, o BAHD (Buenos Aires Haciendo Deportes)
Em Palermo há vários espaços legais para a prática desportiva
Eu tentei mesmo assim. Corridos menos de 3 km percebi que não dava. O almoço queria voltar (desculpe pelo detalhe). Tive de parar de correr na hora. Tomei goles e goles de água para tentar me reestabelecer. Foi um mal estar pesssssado. Abandonei a corrida com 3,39 km, diz o RunKeeper. Depois fiquei caminhando pela região. Tinha passado correndo pelo Roseiral. Então, aproveitei aqueles minutos – ainda debaixo de sol forte – para apreciar as flores.
Voltei para ver as flores do Roseiral
Apesar de o resultado não ter sido o esperado, posso dizer que curti. Ouvi um cara me explicando a sensação boa que é correr em terras estrangeiras. É uma maneira diferente de conhecer a cidade. Certamente. Conheci Buenos Aires de um modo diversos do que já tinha vivido. Na próxima vez que voltar à capital argentina pretendo reservar um tempo especial para correr de novo. Por enquanto, vai aqui um “gracias, mi Buenos Aires querido”.
Voltei para ver as flores do Roseiral
Apesar de o resultado não ter sido o esperado, posso dizer que curti. Ouvi um cara me explicando a sensação boa que é correr em terras estrangeiras. É uma maneira diferente de conhecer a cidade. Certamente. Conheci Buenos Aires de um modo diversos do que já tinha vivido. Na próxima vez que voltar à capital argentina pretendo reservar um tempo especial para correr de novo. Por enquanto, vai aqui um “gracias, mi Buenos Aires querido”.